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Guia de Estudos da Bíblia Satânica

Guia de Estudos da Bíblia Satânica foi concebido para ser uma obra de pesquisa profunda básica da filosofia do movimento Satânico. Trata-se de uma compilação de uma série de anotações e complementos feitas pelos sacerdotes do Templo e Satã, a saber Rev. Obito e este que vos escreve, sobre diversos aspectos importantes da obra máxima de Anton Szandor LaVey.
Este estudo deve ser feito obviamente em conjunto da leitura do texto original. Sugerimos que as capelas regionais se organizem para estudos semanais de forma que em cada encontro um membro apresente em suas próprias palavras um dos capítulo aos demais participantes incluindo nessa apresentação suas próprias críticas e comentários. Ao termino do livro é interessante que o próprio grupo trace novos assuntos para serem palestrados através das discussões que surgirem.
A Bíblia Satânica não é a tábua da lei e deve ser usada mais como provocadora de discussões do que como a palavra final sobre qualquer assunto. Entretanto, caso o grupo ou o estudante individual tenha os meios e a oportunidade não temos como enfatizar o suficiente a importância de ler o texto original em inglês. Traduções podem ser boas e chegarem perto da perfeição mas nada substitui um texto primo.
Shemhamforash!
Morbitvs Vividvs
Templo de Satã
XLIII Anno Satanás

Biblia Satanica, o guia de leitura






Até 1980 todas as impressões da Bíblia Satânica incluíam uma página de abertura com uma extensa lista de dedicatórias, contudo após esse ano tudo o que se lia ao abrir o livro negro era um simples "Para Diane." , referente a Diane Hegarty, primeira esposa de LaVey. Aparentemente, após ter se separado de Diane, LaVey instruiu a editora Avon Books que apagasse sua dedicatória. Evidentemente os editores interpretaram que todos os nomes deveriam ser retirados, exceto o de Diane!
Foi uma verdadeira perda pois nestas páginas haviam muitas dicas de conteúdo e referências que LaVey utilizou para escrever sua obra.
É essencial para entendermos a natureza da Bíblia Satânica que tenhamos acesso às vidas e trabalhos que moldaram e influenciaram os pensamentos e ações de seu autor. Desde 1969 Anton LaVey nos deixava uma boa pista deste tesouro escondido em todas as impressões da Bíblia Satânica, pois estas incluíam uma página de abertura com uma extensiva lista de dedicatórias.
Felizmente a essência deste material foi publicado novamente em 1997 no livro "Lords of the Left Hand Path” de Stephen E. Flowers que resgatamos neste primeiro anexo de nossa tradução para o português. Nesta lista aparecem 19 dedicatórias principais, e 20 outras menções honrosas, incluindo um animal, Togare, suas amantes e os Nove Desconhecidos.
Detalhar a influencia e importância de cada um destes nomes resultaria numa verdadeira enciclopédia, e talvez desestimularia o Satanista a visitar algumas bibliotecas e pesquisar por conta própria. Por este motivo vamos nos limitar a citar cada um do 39 homenageados e fazer uma breve descrição dos 19 principais:
Os 19 nomes principais são, segundo a ordem do autor:
Bernardino Nogara
Karl Haushofer
Grigory Yefimovitch Rasputin
Sir Basil Zaharoff
Alessandro Cagliostro
Barnabas Saul
Ragnar Redbeard
William Mortensen
Hans Brick
Max Reinhardt
Orrin Klapp
Fritz Lang
Friedrich Nietzsche
William Claude Dukinfield
Phineas Taylor Barnum
Hans Poelzig
Reginald Marsh
Wilhelm Reich
Mark Twain

As vinte menções honrosas são, na ordem em que LaVey as listou:



Howard Hughes
James Mood
Marcello Truzzi
Adrian Claude Frazier
Marilyn Monroe
Wesley Mather
Willian Lindsay Gresharn
Hugi Zacchinni
Jayne Mansfield
Frederick Goerner
C.Huntley
Nathaniel West
Horatio Alger
Robert E Howard
George Orwell
H.P Lovecraft
Tuesday Weld
H.G Wells
Sister Marie Koven
Harry Hounini
Togare
Os Nove Desconhecidos.


Esta pequena lista fornece valiosas pistas sobre a formação da filosofia e estilo de vida do satanismo proposto por LaVey.  Além destes poderíamos citar outras influencias implícitas, mas claramente identificáveis na Bíblia Satânica com o por exemplo: Ayn Rand, Gustav Jung, Sigmund Freud, Austin Osman Spare, Aleister Crowley, Alfred Kinsey, entre outros.
Que muitas das idéias de LaVey não são completamente originais é algo amplamente conhecido mesmo por quem conhece pouco sobre o Satanismo, e justamente por isto esta é uma acusação comum entre os detratores do trabalho do Papa Negro. Mas isso é algo que pode ser dito também de quaisquer outras pessoas que tenham criado uma religião. Seja Gautama Buddha e sua releitura do hinduismo ou Gerald Gardner e sua releitura do paganismo, todos aqueles que inauguraram um sistema serviram-se de idéias, descobertas e tradições anteriores.






Introdução de Michael A. Aquino

Cada era do desenvolvimento ético e cultural da humanidade faz emergir seu manifesto literário - um argumento desafiando as normas e propondo uma nova aproximação aos persistentes dilemas da civilização. Não é incomum o caso das realidades políticas nacionais,  moldadas pelo idealismo extra-nacional produzido pelo que hoje cautelosamente chamamos de existencialismo. Trabalhos pertinentes podem incluir a República de Platão, a Política de Aristóteles, o Príncipe de Maquiavel e as obras de Nietzsche, Hobes, Locke, Marx e Sartre.
Este é o livro de nossa era.
O amanhecer da Era Satânica foi celebrado em 30 de abril de 1966, o Ano Um. Nesta data Anton Szandor LaVey consagrou a Igreja de Satã na cidade de São Francisco e assumiu seu posto como primeiro Alto Sacerdote. O que havia começado anos antes como um fórum intelectual dedicado à investigação e estudos das Artes Negras expandiu-se desde então para se tornar um movimento filosófico internacional de primeira magnitude. O Satanismo, antes isolado na clandestinidade e na excentricidade radical havia agora se tornado uma séria alternativa para as doutrinas do teísmo fundamentalista e do materialismo puro. Na conquista da indulgência ao invés de abstinência, a Igreja de Satã rejeitou a noção de que o progresso humano fosse inseparável da aceitação de uma moralidade auto-imposta. O Julgamento deriva da comparação e resolução dos opostos que os Satanistas mantém e ninguém pode presumir ser justo honrando um único padrão de comportamento.
A aproximação empírica da moralidade não é uma invenção recente: teóricos como Pitágoras, Hegel, Spencer e Compte contribuíram com grandes avanços para a independência intelectual do homem frente à ordem natural das coisas. E apesar destes conceitos invariavelmente terem provocado reações adversas nas instituições mantenedoras do status quo, jamais foram tidas como pontos de vistas insubstanciais. As pessoas só precisam constatar os espasmódicos cataclismas da história para testemunhar o quão inadequadamente os Homo Sapiens cooperam entre si.
Sozinha, contudo, toda teoria é inconsistente. Até agora os únicos a advogarem uma moralidade subjetiva foram catedráticos abstracionistas e ocasionalmente os desorientados e desorganizados devotos da "magia branca" tradicional. Estes últimos tímidos diletantes gozam ainda de uma notoriedade imerecida, no quesito livre pensamento, uma vez que proclamam uma moralidade liberal mas se refugiam em apelos de correção social. Estes aficionados pelo oculto são mais bem aceitos pelas massas que dizem ter superado, quando professam uma pública rejeição a Magia Negra ou ao Satanismo, que denunciam como sendo maléficos moralmente degenerados e materialmente abusivos.
Por sua vez, os Satanistas consideram a bruxaria popular como uma reação meramente neurótica contra a religião estabelecida pela cultura paterna. A adoração de qualquer divindade, seja de que natureza for, é repulsiva para um mago negro, que considera qualquer prostração de fé ou crença em proteções sobrenaturais como uma humilhante demonstração de covardia e insegurança emocional. Satanismo não pode ser confundido com “adoração do diabo”, pois na verdade constitui uma forte e clara rejeição a todas as formas de adoração e considera isso um importante componente da personalidade. É tanto uma anti-religião que rebate todas as crenças vulgares adotadas pelas massas, quanto uma não-religião no sentido que não se compromete com nenhum misticismo insubstancial. E isso representa uma ameaça muito mais séria para as teologias organizadas do que o arcaico modelo da antiga demonologia.
Ritual e fantasia tem um papel importante dentro das atividades de uma Igreja Satânica, pois é assumido que a experiência, o controle mental e mesmo a irracionalidade da metafísica são necessárias para o fortalecimento da psique. Portanto um esforço dobrado é feito para evitar o que pode ser considerado o calcanhar de Aquiles das escolas de evolução psicológica de Gurdjieff-Ouspensky: seus primeiros discípulos postularam que toda sensação não-material representava na verdade um perigo para a coerência do estudante. É assim crucial no conceito de Ritual Satânico que haja uma apreciação de suas qualidades, estéticas, ilustrativas e inspiradoras sem necessariamente desbancar em uma realidade inflexível.
O Satanismo pode ser mais apuradamente identificado como uma disposição do que com uma religião, pois uma vez que lida com todas as facetas da existência humana e não somente com os assim chamado aspectos espirituais. Aqueles que alegam que  Satanismo é perigoso para a justiça e a ordem não tem noção do que falam. Satanismo é pela liberdade irrestrita, mas só na extensão em que a liberdade de um não bloqueie a liberdade de outro. Deve ser notado que o Satanismo é uma filosofia de indivíduos e não de massas. Não existem mandamentos políticos coletivos, salvo algo que seria semelhante a famosa incursão de Crowley: "Auto-restrição é o maior de todos os pecados."
Enquanto a maior parte da população pode instintivamente se inclinar para a "adoração do diabo" as precauções de uma Igreja Satânica genuína não são para os irresponsáveis. Não existem missionários satânicos, e para entrar em um grupo é preciso ter certas qualidades bem definidas. Inexperiência não é desonrosa, mas pretensão e hipocrisia são tratadas com o escárnio que merecem. Satanismo não é menos uma arte do que uma ciência, e não há  “nenhum padrão de medida deificado.”
Dr. LaVey está mais do que preparado para ser o autor do Novo Diabolismo. Americano de descendência georgiana, alsaciana com ancestrais ciganos romenos, ele foi rápido em adotar as características de seu sangue nômade e sua inusitada simpatia por sua terra e assuntos arcanos. Um prematuro interesse pelas ciências militares o levou a ler diversas publicações sobre a Segunda Guerra Mundial, apenas para descobrir que as orgulhosas visões da glória marcial que entreteram a primeira grande guerra foi exatamente o que abriu caminho para o mercenário realismo da segunda. Suas experiências como estudante jamais puderam desviar seu gosto pelo cinismo humano e assim LaVey cresceu impaciente no estéril regime de uma educação convencional até que sua busca pelo estranho o levou ao surrealista mundo do Circo. Ele trabalhou no circo Clyde Beatty como treinador de animais selvagens e lá desenvolveu uma forte afinidade com os felinos de grande porte, o que marcou sua personalidade de uma maneira bastante curiosa. Todos os seres animados são basicamente bestiais, ele ponderou, e mesmo as mais refinadas ordens sociais não pode mais do que forçar uma ínfima supressão nesta inata selvageria. Do Circo ele passou para os parques onde as luzes dos espetáculos de arte diariamente marcavam sua rotina. Aqui LaVey trabalhou em um coadjuvante porém digno mundo dos bastidores dos shows de aberrações, e espetáculos sensacionalistas, e aqui aprendeu os truques dos palcos, cujo sucesso depende de fascinar e distrair a atenção da platéia. Friamente ele testemunhou a fascinação que os homens "normais" têm por seus camaradas deformados - uma maliciosa satisfação em visitar a desgraça alheia ao invés da própria. Tornando-se gradativamente mais interessado neste cruel atributo licantrópico da natureza humana, ele estudou criminologia e eventualmente começou a trabalhar como fotógrafo no Departamento de Polícia de São Francisco.
Como profissional do circo ele conheceu o ser humano carnal de seu lado mais artístico; agora ele conhecia seu lado mais terrível. Dois anos de brutalidade, violência, abusos e de toda miséria que permeia a subcultura do crime deixaram ele doente, desiludido e avido por romper com a hipocrisia da educada sociedade. Ele tornou-se tocador de órgãos em boates a cabarés  para sobreviver e devotou grande parte de seus esforços a aquilo que se tornou o trabalho de sua vida - As Artes Obscuras.
Há muito LaVey já rejeitara os tratados estereotipados de feitiçaria cerimonial como histéricos produtos da imaginação medieval. A "Antiga Arte" com suas superstições, maneirismos afetados e barroquismos infantis não eram para ele: o que ele buscava era uma psicologia que cuidasse do homem intelectual apenas depois de ter aprendido a lidar com sua origem brutal e animal. E assim, finalmente ele foi até o Bode de Mendes.
Satã é de longe a figura mais enigmática da literatura clássica. Possuidor de riquezas inconcebíveis e o mais poderoso dos Arcanjos, ele abdicou sua exaltada aliança em vista de proclamar sua independência de toda patronagem paradisíaca. Ainda que condenado aos mais profundos domínios, ao Inferno totalmente incendiado pela divindade, ele enfrentou estas privações como a queima de suas prerrogativas intelectuais. Em seu Império Infernal podia agora ser impunemente indulgente com seus mais extraordinários gostos e ainda assim, rodeado de toda essa licenciosidade o Diabo conseguiu manter sua nobreza peculiar. Foram estas elusivas qualidades que Anton LaVey propôs-se a se identificar.
Depois de longos anos de pesquisa e experimento, ele anunciou a linha guia do Satanismo: os assuntos humanos baseiam-se não na unidade, mas na dualidade. É somente após a síntese desta podemos decidir nossos valores: a aceitação de uma concepção única é portanto sempre insignificante.
As teorias desconcertantes e as operações bizarras de LaVey quanto a Magia Negra eventualmente atrairiam pessoas de mentes semelhantes a dele. Deste pequeno círculo nasceria a Igreja de Satã, que de acordo com as palavras de seu fundador, deveria apresentar sua mensagem de modo mais efetivo se pudesse seguir a receita de "nove partes de respeitabilidade social por uma parte de ultraje.”
O impacto social e espetacular crescimento da Igreja tornaram-se lendas por si mesmas, mas formaram uma parte essencial da convicção de Lavey  de que o papel de sua instituição era principalmente o de um cataclisma. A civilização contemporânea provou ser interdependente demais para permitir qualquer luxúria de isolamento monástico. O Satanismo deveria, portanto assumir a liberdade de seus membros e ser acessível a diferentes pessoas em diferentes lugares. Foi com este intento que a Bíblia Satânica foi escrita.
A Bíblia Satânica é um documento cativante. Algumas pessoas são fortemente tentadas a compará-la ao obscuro, maléfico e mitológico "Rei de Amarelo", uma obra tão psicologicamente perturbadora que supostamente poderia levar seus leitores a loucura e a danação. Por mais civilizada e coloquial que a Bíblia Satânica possa parecer num primeiro relance, este não é um volume pelo qual podemos passar impunemente. Ele é produto de nosso tempo, não apenas porque este livro - assim com seu autor - teria sido eliminado em uma era anterior, mas porque sua criação foi uma inevitabilidade evolucionária, uma conseqüência inevitável da época em que vivemos.
Você leitor, está prestes a ser empalado pelos afiados chifres de um dilema Satânico. Se aceitar as proposições deste livro, estará condenando seus mais festejados santuários à aniquilação. Em troca você despertará - no mais temido dos infernos. Rejeite, contudo estes argumentos, e estará condenando a si mesmo a uma cancerígena desintegração daquilo que ainda resta de seu senso de identidade. Não é difícil imaginar porque o legado do arquirival tem ganhado até hoje tantos inimigos!
Qualquer que seja sua decisão, ela não pode mais ser adiada. A Bíblia Satânica, finalmente articula aquilo que a humanidade instintivamente anseia proclamar: a de que ela é afinal de contas potencialmente divina.





Michael Aquino liderou a primeira segmentação do movimento satânico ao fundar o Templo de  Set, uma dissidência da Igreja de Satã em 1975. Esta Introdução no entanto foi escrita enquanto Aquino era Sacerdote da Igreja de Satã e aparece na versão em capa dura da Bíblia Satânica, em 1972 da Editora Wehman Brothers e na versão da Avon Books de 1972 à 1976




Introdução de Burton W. Holfe
Burton H. Wolfe*[1]
Numa noite de inverno de 1967, dirigi rumo a São Francisco para ouvir uma palestra de Anton Szandor LaVey em um evento aberto da Liga pela Liberdade Sexual. Fui atraído pelos artigos de jornais descrevendo-o como o “Papa Negro” de uma igreja satânica onde o casamento, o batismo e as cerimônias de funerais eram dedicados ao Diabo. Na época eu era um escritor free-lance e senti que havia uma boa história em LaVey e seu paganismo contemporâneo, pois o Diabo sempre rendeu boas histórias como se diz nas redações dos jornais.
Não era a prática das artes negras que eu considerava o quente da história, porque isso é notícia velha. Adoradores do diabo, e cultos voodoos existiam mesmo antes dos cristãos. No século dezoito o Hell-Fire Club da Inglaterra e suas conexões com a colônia americana por meio de Benjamin Franklin ganhou boa notoriedade. Durante a primeira parte do século vinte a imprensa já alardeava Aleister Crowley como o “homem mais perverso do mundo”. E houve ainda os picos dos anos vinte e trinta com a Ordem Negra na Alemanha.
Para esta velha história LaVey e sua organização de faustianos contemporâneos ofereceu dois impressionantes novos capítulos. Primeiramente apresentaram-se de forma blasfema como uma Igreja, um termo até então exclusivamente cristão, no lugar do tradicional coven de bruxas e Satanistas. Em segundo lugar eles praticavam agora suas artes negras abertamente ao invés de escondidos nas sombras e nos subterrâneos.
Antes de arranjar uma entrevista com LaVey sobre suas inovações heréticas, minha primeira etapa habitual de pesquisa foi ouvir com atenção sua palestra como um membro não identificado da platéia. Em alguns jornais ele já havia sido descrito como um treinador de leões e picareta que representava agora o papel de representante do diabo na terra, e eu queria antes de qualquer coisa descobrir se ele era um verdadeiro Satanista ou só mais um enganador. Eu já havia encontrado pessoas sob os holofotes antes no mundo do ocultismo; de fato tive um caso com Jeane Dixon e pude escrever sobre ela antes de Ruth Montgomery. Contudo eu considerava todos os ocultistas, malandros, hipócritas e estelionatários, e não gastaria sequer cinco minutos escrevendo sobre suas várias formas de hocus pocus.
Todos os ocultistas que eu já havia encontrado eram magos brancos, adivinhos, mediums e bruxas que alegavam que seus poderes místicos e comunicações espirituais eram de uma forma ou outra abençoados pela divindade. LaVey parecia rir destes e desprezá-los e pelo que eu pude ler nos jornais baseava seu trabalho no lado negro da natureza e no lado carnal da humanidade. Parecia de fato não haver nada de espiritual em sua Igreja.
Enquanto escutava LaVey falar pela primeira vez eu percebi que não havia nada que ligasse ele aos negócios do ocultismo. Ele sequer poderia ser descrito como um metafísico. Sua oratória era brutalmente franca, pragmática, relativista e acima de tudo racional. Isso sim era não ortodoxo, uma explosão na religiosidade estabelecida, na repressão da natureza carnal do ser humano e na piedade enquanto vivemos nesta existência material baseada no cão-come-cão. Era também cheio de humor sardônico em relação à estupidez humana. Mas o mais importante de tudo era que sua conversa era lógica. LaVey não estava oferecendo a platéia um show de mágica, mas bom senso baseado nas realidades da vida.
Depois que me convenci da sinceridade de LaVey, tive que convencer ele de que pretendia fazer uma pesquisa séria e não uma simples entrevista sobre a Igreja de Satã como um novo tipo de show de aberrações. Fui fundo então no Satanismo, discuti sua história e raciocínios com LaVey e presenciei a alguns rituais na antiga mansão vitoriana que já fora o quartel general da Igreja de Satã. Com tudo isso escrevi um sério artigo, apenas para descobrir que não era o que os editores respeitáveis queriam publicar. Eles estavam mesmo interessados em um show de aberrações. Finalmente a revista masculina Knight publicou, em setembro de 1968, o primeiro artigo definitivo sobre a moderna filosofia e prática do Satanismo, que todos os seguidores e imitadores usam agora como modelo, guia ou mesmo como sua bíblia.
Meu artigo de revista foi um começo e não um fim (como havia sido com meus outros artigos já escritos), de uma longa e intima associação. Dela veio a primeira biografia de LaVey, The Devil’s Avenger, publicada pela Pyramid em 1974. Depois que o livro foi publicado, eu me tornei um membro de carteirinha e consequentemente um sacerdote da Igreja de Satã, um título que eu orgulhosamente dividi com muitas pessoas célebres. As discussões depois da meia noite que tive com LaVey em 1967 continuam até hoje, uma década depois, adicionada as vezes por uma bela bruxa satânica ou por um pouco da música com ele no órgão e eu na bateria, em um cabaré bizarro povoado por humanóides super-realistas criados por LaVey.
Tudo no passado de LaVey parecia prepará-lo para este papel. Ele é um descendente de avós georgianos, romenos e alsacianos, incluindo uma avó cigana que o criou em meio a lendas de bruxas e vampiros de sua terra natal, a Transilvânia. Aos cinco anos, LaVey lia revistas de terror, e livros como o Frankestein de Mary Shelley e Drácula de Brans Stoker. Apesar de ser diferente das outras crianças era desde cedo apontado como o líder para as paradas e marchas cívicas.
Em 1942, quando LaVey tinha doze anos, sua fascinação eram os soldadinhos de brinquedo da Segunda Guerra Mundial. Ele se debruçava em manuais militares e descobria que os arsenais e equipamentos bélicos podiam ser comprados como doces em supermercados para conquistar outras nações. A idéia tomou forma em sua mente então de que ao contrário do que a bíblia cristã lhe ensinava o mundo não poderia ser herdado pelos fracos, mas sim pelos poderosos.
No colégio, LaVey se revelou como uma criança prodígio alternativa. Reservando seus estudos mais sérios para fora do horário de aula, dedicava-se a música, metafísica, e aos mistérios do oculto. Aos quinze anos foi o segundo oboísta na orquestra sinfônica de São Franscisco. Entediado com suas aulas, LaVey abandonou os estudos, saiu de casa e juntou-se ao Clyde Beatty Circus, como tratador de tigres e leões. O treinador de animais Bratty percebeu então que LaVey sentia-se confortável trabalhando com felinos de grande porte e convidou-o então a tornar-se seu assistente.
Dotado desde a infância pela paixão as artes e cultura, LaVey não contentou-se em meramente com a excitação de treinar bestas selvagens e trabalhar no picadeiro como substituto de Bratty. Aos dez anos ele aprendeu sozinho a tocar piano e ouvido e isso mostrou-se muito útil quando o tocador de calliope do circo chegou bêbado logo antes de uma apresentação, incapaz de fazer o acompanhamento musical. LaVey ofereceu-se para tocar no lugar dele, confiante de que poderia lidar com aquele estranho teclado para fornecer o fundo musical necessário.  Ficou obvio então que na verdade ele conhecia mais música e tocava melhor do que o tocador de calliope original, de modo que Beatty dispensou o bêbado e colocou LaVey em seu lugar. Ele acompanhava então o “Bala Humana”, Hugo Zachia e o número de equilíbrio dos Wallendas[2], entre outros.
Quando LaVey tinha dezoito anos, largou o circo e juntou-se a um parque de diversões. Lá tornou-se assistente de mágico, aprendeu hipnose e estudou mais sobre ocultismo. Era uma combinação curiosa. De um lado ele trabalhava em uma atmosfera de vida bastante intensa, de música terrena, cheiro de animais e poeira, onde um segundo perdido poderia significar um acidente ou mesmo a morte. Apresentações que exigiam força e juventude, um mundo de excitação física de atrações mágicas. Por outro lado trabalhava com magia e o lado negro do cérebro. Provavelmente esta estranha combinação influenciou a maneira com que ele começou a ver a humanidade enquanto tocava órgão para as apresentações do parque.
"Nas noites de sábado”, lembrava LaVey em uma de nossas longas conversas. “...eu via homens desejando as mulheres exóticas que dançavam semi-nuas em algumas das tendas do parque e na manhã seguinte, no domingo, enquanto tocava órgão para os evangelistas em uma de suas tendas no outro extremo do parque, eu via esses mesmos homens sentados lá dentro, com suas esposas e filhos, pedindo para que Deus os perdoassem e os limpassem de seus desejos carnais. E na próxima noite de Sábado lá estavam eles novamente nas tendas das dançarinas ou em outro local de indulgências. Eu soube então que a Igreja Cristã prospera em hipocrisia, e que a natureza carnal do homem sempre prevalecerá!”
Apesar de não se aperceber disso, LaVey estava no caminho de formular uma religião que serviria de antítese à cristandade e sua herança judaica. Era uma religião antiga, mais antiga que o Cristianismo ou o Judaísmo, mas que nunca havia sido formalizada, e arrumada em forma de doutrina e ritual. Este era o papel de LaVey na civilização do século vinte.
Depois de tornar-se um homem casado em 1951, aos vinte e um anos, ele abandonou o fantasioso mundo dos parques e iniciou uma carreira mais condizente para um pai de família. Ele foi contratado como criminologista. Este foi seu primeiro trabalho conformista, fotógrafo para o departamento de polícia de São Francisco. Conforme percebeu depois, este trabalho seria especialmente importante, mais do que qualquer outro para o desenvolvimento do Satanismo como um modo de vida.
”Eu vi o lado mais sangrento e nefasto da natureza humana...”, recordou LaVey em uma das entrevistas em que relembrava sua vida passada. “Pessoas baleadas por malucos, esfaqueadas por amigos, crianças pequenas com as tripas de for a atropeladas por motoristas anônimos. Era nojento e deprimente. Eu me perguntava: “Onde está Deus?”. Eu passei então a detestar a atitude santificada das pessoas frente a violência, sempre dizendo que ‘era a vontade de Deus.’”
Assim, ele largou com nojo a função após três anos como fotógrafo criminal e retornou para o seu órgão, desta vez tocando em casas noturnas e teatros para ganhara vida enquanto continuava seus estudos sobre a paixão de sua vida: as artes negras. Uma vez por semana passou a dar palestras sobre tópicos arcanos, como assombrações, Percepção Extra-Sensorial, sonhos, vampiros, lobisomens, divinação, magia cerimonial, etc... Isso atraiu muitas pessoas que eram ou tinham sido bem conhecidas seja campo das artes, das ciências, ou dos negócios. Eventualmente, um “Circulo Mágico” evoluiu deste grupo.
O propósito maior do Círculo era o de se reunir para a execução de rituais mágicos que LaVey havia descoberto e desenvolvido após ter acumulado uma vasta biblioteca de trabalhos descrevendo Missas Negras e outras cerimônias infames de grupos como os Cavaleiros Templários da Franca do Século XIV ou do Hell-Fire-Club e da Golden Dawn, do século XVIII e XIX na Inglaterra. O objetivo de algumas destas ordens secretas era o de blasfemar e parodiar a Igreja Cristã, de forma que se voltavam para o Diabo como uma deidade antropoformica que representava o inverso de Deus. Mas na visão de LaVey, o Diabo não era isso, mas sim uma força negra e escondida na natureza, responsável pelo funcionamento das coisas terrenas, uma força que nem a ciência nem a religião tinham uma explicação. O Satã de LaVey é o “espírito do progresso, que inspirou todos os grandes movimentos que contribuíram com o desenvolvimento da civilização e o avanço da humanidade. Ele é o espírito da revolta que conduz a liberdade, a personificação de todas as heresias que libertam.”
Na última noite de Abril de 1966, Walpurgisnacht, o mais importante festival no campo da magia e da bruxaria, LaVey ritualisticamente raspou o cabelo de acordo com a tradição mágica e anunciou a formação da Igreja de Satã. Para uma identificação de seu ministério adotou um colarinho de padre, que lhe dava uma imagem santificada. Mas sua cabeça raspada como a de Genghis Khan, seu Mefistófilico cavanhaque e seus olhos desafiadores davam a ele o necessário aspecto demoníaco para um sacerdote da Igreja do Diabo na terra.
De certo modo,” explicou LaVey, “... chamar isso de uma Igreja me permite seguir a fórmula mágica de uma parte de ultraje e nove partes de respeitabilidade social que é necessária para o sucesso. Mas o propósito maior era unir um grupo de indivíduos em sintonia que com suas energias combinadas podem invocar a energia obscura da natureza chamada Satã.”
Como LaVey mostrou, todas as outras Igrejas são baseadas na adoração do espírito e na negação da carne e do intelecto. Ele enxergou então a necessidade de uma igreja que retomasse a mente humana e os desejos casuais como objetos de celebração. O Interesse próprio racional seria encorajado e a saúde do ego conquistada. Ele percebeu então que o antigo conceito de Missa Negra e sátira à cristandade estavam fora de contexto, ou como ele mesmo disse equivalia a “chutar um cavalo morto”. Na Igreja de Satã LaVey inaugurou então alguns psicodramas que substituíram o serviço de crítica cristã, pois equivaliam a um exorcismo das repressões e inibições impostos pelas religiões da luz branca.
Havia na época uma revolução na própria Igreja Cristã contra os rituais ortodoxos e às tradições. O conceito de “Deus está morto” tornava-se popular. Assim, os rituais alternativos de LaVey funcionavam mantendo algumas das antigas cerimônias ao mesmo tempo que mudava a simples paródia para formas positivas de celebração e purgação: Casamentos Satânicos consagravam as delicias da carne, funerais quebravam padrões santificados, rituais de luxúria ajudavam indivíduos a satisfazerem seus desejos sexuais e rituais de destruição habilitavam os membros da Igreja Satânica a triunfarem sobre seus inimigos.
Em ocasiões especiais como batismos e funerais em nome do Diabo, a cobertura de imprensa, apesar de não solicitada era fenomenal. Em 1967 os jornais que enviaram repórteres para escreverem sobre a Igreja de Satã iam de São Franscisco, pelo Pacífico até Tokyo e pelo Atlântico até Paris. Uma foto de uma mulher nua parcialmente coberta por uma pele de leopardo servindo de altar para LaVey em uma cerimônia matrimonial foi transmitida pela mídia em toda parte, ilustrando inclusive a primeira página de publicações como o Times de Los Angeles. Como resultado da publicidade, capelas filiadas a Igreja de Satã espalharam-se pelo mundo, provando uma das principais mensagens de LaVey: “O diabo está vivo e  está em alta.”
É claro que LaVey ensinava para qualquer um disposto a ouvir que o Diabo, para ele e seus seguidores não era aquele estereotipo avermelhado, com chifres, rabo e tridente, mas a sombria força natural para a qual os  seres humanos estão começando a se conscientizar. Como LaVey justificava esta definição, frente a suas próprias aparições públicas com chifres e tridente? Ele responde: “As pessoas precisam de rituais, com símbolos como os que podemos encontrar em uma partida de baseball, nas igrejas ou nos exércitos, como veículos que expressam as emoções elas podem canalizar o que sentem e entender a si próprias.” Contudo, o próprio LaVey  em breve se revelaria cansado de brincadeiras.
Ouve um histórico quanto a isso. Em primeiro lugar, os vizinhos de LaVey começaram a reclamar do leão adulto que ele criava como um animal de estimação, e eventualmente o felino foi doado ao zoológico local, e então a morte de uma das bruxas mais devotadas de LaVey, Jayne Mansfield, causada por uma maldição que ele mesmo havia lançado em Sam Brody, o advogado e amante de Mansfield, pelas razões explicadas no livro Devil’s Avenger. LaVey a havia alertado insistentemente para se afastar de Brody e sentiu-se deprimido depois de sua morte. Esta era a segunda morte de um estrela de Hollywood, símbolo sexual com a qual ele esteve envolvido: a outra foi Marilyn Monroe, que teve uma breve mais crucial relação com LaVey em 1948 no período em que ele havia abandonado os parques, mas ainda acompanhava com o órgão  as strippers de Los Angeles.
Além de tudo isso, LaVey estava cansado de organizar entretenimento e rituais de purgação para os membros da Igreja. Ele havia entrado em contado com os últimos remanescentes vivos das fraternidades ocultas da Europa pré-guerra, mas estava ocupado demais para estudar sua filosofia e rituais da era pré-hitleriana de modo que precisava de mais tempo para seus interesses pessoais, para escrever e trabalhar novos conceitos. Ele já havia experimentado e aplicado princípios de geometria oculta que nos seus próprios termos chamava de “A Lei do Trapezóide” (e de fato, ele lamentava a moda da época daqueles que “procuravam nas pirâmides erradas”). Ele também havia se tornado um convidado bem conhecido em programas de rádio e televisão e trabalhava as vezes como produtor e conselheiro técnico para filmes e documentários de temáticas satânicas. Em raros momentos também trabalhava como ator. Como apontou o sociólogo Clinton R. Sanders: “… nenhum ocultista teve tanto impacto na representação cinematográfica do Satanismo do que Anton Sazandor Lavey. A ritualística e o simbolismo esotérico eram elementos centrais na igreja de LaVey e os filmes que assessorou continham retratos fieis dos rituais satânicos e dos tradicionais símbolos ocultos. A ênfase nos rituais da Igreja de Satã, tinham a “intenção de focar o poder emocional dentro de cada indivíduo.” Da mesma forma o ritualismo ornamental central nos filmes com a participação de LaVey podem ser vistos como mecanismos que envolvem e focam a experiência emocional da platéia.
Por fim, LaVey decidiu transferir a responsabilidade dos rituais e da organização de outras atividades para as capelas da Igreja de Satã espalhadas pelo mundo, a  escrever, palestrar e ensinar os conceitos mais profundos do Satanismo e a sua família: sua esposa Diane, uma bela loira que ocupava o cargo de Alta Sacerdotisa da Igreja, sua filha Karla, agora com vinte anos, uma criminologista ainda mais brilhante do que seu pai que viajava pelo país expondo o satanismo para platéias de diversas universidades, e finalmente Zeena, sempre lembrada por sua famosa foto do primeiro batismo satânico da história, mas que agora havia se transformado em uma magnífica e atraente adolescente.
Deste período de relativo sossego surgiram seus livros pioneiros e amplamente lidos: Em primeiro lugar a Bíblia Satânica, que hoje já passa de sua vigésima edição. Depois veio Os Rituais Satânicos, que cobre muito do vasto material prático recolhido e desenvolvido por LaVey. Em terceiro lugar “A Bruxa Satânica” um bestseller na Itália mas ainda pouco conhecido do público norte-americano[3].
Dedicando-se em desenvolver seus livros e a filosofia satânica e descentralizando a organização de sua Igreja, LaVey contribuiu ainda mais para a expansão e filiação a Igreja de Satã. O Satanismo cresceu em popularidade e foi então naturalmente acompanhado de histórias de grupos que protestavam contra a presença da bíblia Satânica nas lojas e nos campus das universidades, pois isso contribuía para que a juventude “desse as costas para Deus”.  É de se suspeitar se o Papa João Paulo não tinha LaVey em mente quando disse dois anos atrás que o Diabo “está vivo em pessoa”, um vivente habitante do fogo espalhando o mal pela Terra. Lavey concordava que o mau está vivo e que deveria ser desfrutado, respondendo ao papa e outros religiosos da seguinte forma:
“Pessoas, organizações e nações estão fazendo milhões de dólares graças a nós. O que eles fariam sem a gente? Sem a Igreja de Satã eles não teriam ninguém a quem odiar e culpar por todas as coisas terríveis que estão acontecendo no mundo. Senão as pessoas teriam que acreditar que eles são realmente charlatões, de modo que devem estar no fundo bastante felizes de nos ter por perto para nos explorar. Nós somos um commodity de alto valor hoje em dia. Nós somos bons para os negócios, fazemos a economia fluir e alguns dos milhões que geramos vão parar em bolsos cristãos. Nós provamos muitas vezes a Nona Declaração Satânica de que a Igreja, e incontáveis indivíduos não poderiam existir sem o Diabo.”
Mas por isso as igrejas cristãs devem pagar um preço. Os eventos que LaVey predisse na primeira edição da Bíblia Satânica já estão acontecendo a todo redor. Pessoas reprimidas levantam sua voz. O Sexo explodiu, e a libido coletiva esta estampada em filmes e revistas, nas ruas e nas casas. As pessoas dançam de topless e “bottomless”. Freiras têm abandonado seus antigos hábitos, exposto suas pernas e dançado a versão heavy metal da missa solene[4] que LaVey havia sugerido como piada. Há uma demanda universal por entretenimento, boa comida, vinho, diversão e desfrute da vida aqui e agora. A humanidade como um todo não quer mais esperar as a recompenses que supostamente vêem depois da vida. Há uma tendência ao neo-paganismo e ao hedonismo, e enquanto a massa vive a vida terrena dela tem emergido uma boa variedade de indivíduos brilhantes: médicos, atores, advogados, engenheiros, professores, escritores, acionistas, políticos, atores e publicitários e comunicadores (para citar algumas poucas categoriais de Satanistas) interessados em formalizar e perpetuar esta onipresente religião e modo de vida.
Não é uma religião simples de adotar em um sociedade dominada a tanto tempo por uma ética puritana. Não existe falso altruísmo, nem mandamento para amar o seu vizinho nesta religião. Satanismo uma filosofia brutal, a descaradamente egoísta e cruelmente sincera. É baseada na crença de que o seres humanos são criaturas egoístas e violentas, que a vida é um campo darwiniano de sobrevivência do mais apto, que só os mais fortes sobrevivem e que a terra é regida por aqueles que lutam para vencer esta disputa sem fim que existe em todas as selvas incluindo aquelas feitas de vidro e concreto.
Você é livre para abominar esta visão se quiser; ela é baseada no que tem sido a humanidade por séculos e nas reais condições que existem no mundo que habitamos ao invés de naquela terra de leite e mel que encontramos na Bíblia Cristã. Na Bíblia Satânica, Anton LaVey explica a filosofia do Satanismo mais profundamente do que qualquer um de seus antecessores do Reino das Trevas, ele descreve em detalhes seus inovadores rituais e dispositivos desenvolvidos para a criação de uma igreja de pessoas realistas.  Está claro desde a primeira edição que muitas pessoas leram este livro para aprender como manter grupos satânicos e realizar rituais de magia negra. A Bíblia Satânica e os Rituais Satânicos são os únicos livros que têm demonstrado até hoje de maneira autêntica a relevante como isso tudo pode ser feito. Houve muitos imitadores que jamais mencionaram a fonte original, e isso fizeram com uma boa razão: uma vez que o despreparo e leviandade dos imitadores são comparados com o os trabalhos pioneiros e LaVey, eles passam a ser vistos como simples e incapazes plagiadores.
A evidência é clara para qualquer um que puder comparar: Anton LaVey trouxe Satã para fora do armário e a Igreja de Satã foi a fonte de onde jorrou o Satanismo contemporâneo. Este livro reúne sua mensagem e serve de desafio e inspiração, tanto hoje como no tempo em que foi escrito.
SÃO FRANSCISCO
25 de Dezembro de 1976 (XI Anno Satanas)



[1] Burton H Wolfe, foi o primeiro repórter a cobrir seriamente o movimento satânico. Filiou-se a Igreja de Satã em 1974 após uma série de entrevistas que fez com LaVey. Esta introdução aparece na Bíblia Satânica editada pela Avon Books desde 1976
[2] Uma das mais tradicionais e conhecidas famílias de equilibristas do mundo. Detentoras de inúmeros prêmios e récordes mundiais de travessia na corda bamba sem rede de proteção.
[3] Lançado no Brasil pela editora Madras.
[4] Missa solene é a missa cantada em que o celebrante é auxiliado pelo diácono e subdiácono.






Introdução de Rev. Obito do Templo de Satã

Já faz mais de 30 anos que a versão original deste livro foi escrita e apresentada para o grande público. De lá para cá o Satanismo tomou rumos que talvez espantassem o próprio LaVey. Sua Igreja acabou dando origem a outras “concorrentes”, a religião que professava originou  outras contemporâneas e tirou das sombras pessoas que diziam seguir versões mais antigas dela. LaVey foi chamado de fraude, mentiroso, aproveitador. A sede da Igreja de Satã não é mais em São Francisco, na Casa Negra que foi demolida, mas em Nova Iorque, hoje, enquanto escrevo esta introdução LaVey está morto há XX anos, e o Satanismo continua atual como nunca.
Não importa se LaVey foi ou não domador de leões ou tocador de órgão em parques de diversões. A crença que ele organizou e difundiu continua forte. Nos Estados Unidos o Satanismo deu origem ao Luciferianismo, ao culto a Set, antiga deidade egípcia, grupos que cultuam vampiros e muitos outros que hoje discutem o que seria o Verdadeiro Satanismo. Grupos perdem tempo procurando no passado de LaVey e da Igreja de Satã falhas ou mentiras que possam usar para justificar suas próprias verdades, para, montados sobre seu cadáver, se mostrarem autênticos, são cães disputando entre si pedaços de carne. O Verdadeiro Satanismo não estava em LaVey, que organizou e escreveu este livro, às vezes se inspirando ou mesmo plagiando outros. O Verdadeiro Satanismo não está na Igreja que ele criou ou naqueles que a dirigem hoje, nem nos grupos que se originaram dela.
O Satanismo é um caminho pessoal e único. Este livro não é um livro de respostas ou de auto ajuda para você se encontrar, nem tampouco um manual “passo a passo” para você se tornar um Satanista. A Religião Satânica é um conjunto de ideologias, uma base filosófica, que pode ou não ter afinidade com as suas. Você não se converte ao Satanismo mas quando começa a estudar e praticar a crença descobre que sempre foi um, apenas não havia encontrado ainda outras pessoas que tivessem a mesma visão que você tem do mundo. O Verdadeiro Satanismo existe dentro do coração e da mente de cada Satanista, ele se reflete em seus atos e não em livros ou sermões. Este livro, esta Bíblia Satânica, é apenas a primeira expressão impressa desse modo de lidar com o mundo no dia a dia. Esperamos que através da leitura e do estudo deste livro você se descubra de uma maneira nova e isso te leve a novos patamares de sua existência.
Se ao terminar de ler este livro perceber que finalmente encontrou algo que resume tudo aquilo que você pensa e sente, sentir que algo dentro de você despertou e começa a rugir não se espante: você não está sozinho! Pessoas têm encontrado no Satanismo, um ótimo meio de classificar seu modo de vida humano, terreno e cruelmente sincero desde 1966.
Dizer que o Satanismo não existe no Brasil ou que está apenas engatinhando é ser, no mínimo, ingênuo. Hoje existem muitos grupos pequenos afastados, praticantes solitários sérios, iniciantes que não descobriram como encontrar outros; mas isso não quer dizer que não existamos, apenas não nos organizamos ainda. Em 1997 formou-se o primeiro grupo satânico organizado em terras tupiniquins, a Igreja de Lúcifer, ele teve vida curta mas muitos de seus membros ainda estão ativos.
Hoje o Templo de Satã busca criar bases mais sólidas e organizar organizados apareçam erguendo a bandeira negra com o Sigilo de Baphomet, reunindo irmãos e irmãs que hoje se encontram dispersos e oferecendo auxílio para os que ainda estão no início de sua jornada pela senda sinistra. Esperamos que a tradução e divulgação deste livro seja apenas mais um passo para que isso se realize.

São Paulo
21 de abril de 2004
(XXXIX Anno Satanas)




Prefácio


Este livro foi escrito porque com raras exceções todos os tratados e documentos mágicos, cada grimório “secreto”, todos os “grandes trabalhos”, não passam de fraudes santarronas[1] – incoerências inspiradas pela culpa e baboseiras esotéricas escritas por cronistas de uma erudição mágica incapazes ou sem vontade de apresentar uma visão objetiva do subjetivo. Escritor após escritor no afã de exprimir os princípios da “magia branca ou negra” conseguiu obscurecer completamente o assunto de tal maneira que a pessoa que deseja se tornar uma estudante de magia encontra um destino estúpido, com os dedos sobre uma prancha numa tábua de Ouija[2], ficando de pé no centro de um pentagrama esperando que um demônio apareça, jogando I-Ching de maneira hesitante da mesma forma que muitos atiram moedas para mendigos, embaralhando cartas para prever um futuro que perdeu qualquer significado que pudesse ter, atendendo a seminários que acabam com seus egos – e com o dinheiro dentro de suas carteiras – e por via de regra acabam fazendo papel de bobo aos olhos daqueles que realmente sabem!
O verdadeiro mago sabe que as livrarias de ocultismo estão repletas de frágeis relíquias vindas de mentes apavoradas e corpos estéreis, diários metafísicos de auto engano e manuais constipados sobre misticismo Oriental. Por muito tempo os trabalhos sobre Magia e Filosofia Satânica foram escritos por articulistas que trilham o Caminho da Mão Direita com seus olhos arregalados pelo terror.
A velha literatura é o subproduto de mentes ulceradas pelo medo e pela derrota, escritos buscando a ajuda inconsciente daqueles que realmente dominam o mundo e que, sentados em seus tronos infernais, gargalham com nociva alegria.
As chamas do Inferno queimam mais fortes e brilhantes inflamadas por esses respeitáveis volumes de desinformação e falsas profecias.
Neste livro você encontrará a verdade – e fantasia. Uma é necessária para que a outra exista; mas ambas devem ser reconhecidas pelo o que são. O que você encontrar aqui pode não ser sempre agradável; mas você encontrará!
Aqui está o pensamento Satânico por um ponto de vista verdadeiramente Satânico.
Anton Szandor LaVey
Igreja de Satã
São Francisco, Walpurgisnacht 1968





[1] Samuel Butler (1835 - 1902), ex- pastor anglicano que começou a questionar sua fé apos constatar que o batismo não fazia qualquer diferença no comportamento moral de seus diletos, faz um apelo semelhante ao surgimento de uma obra como a Bíblia Satânica. Diz ele em “The Note-Books of Samuel Butler”: “Devemos desculpas ao diabo: lembremos que até hoje nós só demos ouvidos a um dos lados da história. Deus tem escrito todos os livros.”
[2] A Tábua de Ouija é a versão de tabuleiro do “jogo do copo”. Consiste em um tabuleiro de papelão ou madeira que tem na parte superior as letras do alfabeto, na inferior números de 1 a 0 e localizadas no centro da tábua nos cantos opostos a palavra SIM e NÃO. O praticante usa uma prancha triangular com uma lente no centro. Supostamente espíritos movem a prancha em resposta a perguntas feitas pelo operador até que a lente fique sobre uma letra ou número, formando assim palavras, datas, etc.





Prólogo
Os deuses do caminho da mão direita brigaram e lutaram entre si por uma era inteira da Terra. Cada uma dessas deidades e seus respectivos sacerdotes e ministros tentaram encontrar  sabedoria em suas próprias mentiras. A era glacial do pensamento religioso não pode durar mais do que um curto tempo neste grande esquema da existência humana. Os deuses daqueles de sabedoria maculada já viveram suas sagas, e seus milênios se tornaram realidade. Cada um, com seu próprio caminho “sagrado” levando ao paraíso, tendo acusado ao outro de heresia e inconsideração religiosa. O Anel de Nibelungo[1] de fato traz consigo uma maldição eterna, mas apenas porque aqueles que o buscam vivem em termos de “Bem” e “Mal” – estando eles mesmos sempre do lado do “Bem”. Os deuses do passado acabaram se transformando em demônios, exatamente iguais àqueles que combatiam, para poder continuar vivendo. Débeis, seus ministros jogam o jogo do diabo para manterem seus relicários cheios e a hipoteca de seus templos paga.
Ah!, por quanto tempo eles estudaram os caminhos da “virtude”, e que exemplares medíocres e incompetentes de diabos eles se tornaram. Então tomados por grande desespero todos eles dão as mãos em uma união “fraternal” e se dirigem ao Valhalla[2] para realizar seu último grande conselho ecumênico. “Se aproxima o brilho do crepúsculo dos deuses”. Os corvos da noite já partiram em seu vôo para convocar Loki, que incendeia Valhalla com seu incandescente tridente infernal. O crepúsculo terminou. O brilho de uma nova luz nasce da noite e Lúcifer ergue-se mais uma vez para proclamar: “Esta é a era de Satã! Satã governa a Terra!”. Os deuses dos injustos estão mortos. Este é o alvorecer da magia e da sabedoria imaculada. A CARNE prevalece e uma grande Igreja se erguerá e será consagrada em seu nome. A salvação do homem não dependerá mais de sua própria negação e todos saberão que o evangelho da carne e da vida será a maior preparação para todo e qualquer deleite eterno.
REGIE SATANAS!
AVE SATANAS!
HAIL SATAN!
SALVE SATÃ!





[1] O Anel de Nibelungo: (DER RING DES NIBELUNGEN) Tetralogia operística de Richard Wagner. A primeira ópera intitula-se "Das Rheingold" (O Ouro do Reno), conta a história sobre o anel mágico que é capaz de dar a quem o possuir imenso poder, o anel é amaldiçoado por seu dono quando Wotan (Odin) e Loki o tomam daquele que o confeccionou, o anão Alberich. Logo em seguida Erda, a deusa da Terra, faz a predição do fim dos deuses no Ragnarok. Os deuses então, tendo ouvido sobre seu destino, sobem pela Ponte do Arco-Íris em direção a Asgard.
[2] O correto talvez fosse evocar aqui Asgard e não o Valhalla.



As Nove Declarações Satânicas
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(enxofre negro)
1. Satã representa indulgencia ao invés de abstinência!
2. Satã representa a vida ao invés ilusões espirituais!
3. Satã representa a sabedoria livre de preconceitos ao invés da auto ilusão hipócrita!
4. Satã representa bondade para aqueles que a merecem ao invés de amor desperdiçado com ingratos!
5. Satã representa vingança ao invés de oferecer a outra face!
6. Satã representa responsabilidade para o responsável ao invés de tempo gasto com vampiros psíquicos!
7. Satã representa o homem como qualquer outro animal, às vezes melhor, mas freqüentemente pior do que aqueles que caminham em quatro patas, e que graças ao seu "desenvolvimento intelectual e espiritual divino”  se tornou o animal mais corrupto e cruel de todos!
8. Satã representa todos os assim chamados pecados, pois todos levam à gratificação física, mental e emocional!
9. Satã é o melhor amigo que a igreja jamais teve, pois é graças a ele que ela se manteve funcionando por todos esses anos!











(Fogo) O Livro de Satan
Citação chave: "O primeiro livro da Bíblia Satânica não foi concebido como uma grande blasfêmia mas sim como um manifesto daquilo que pode ser chamado de “indignação diabólica”. O Diabo tem sido  atacado de forma implacável e ininterrupta pelos homens de Deus e, excluindo-se algumas obras de ficção, nunca houve uma oportunidade para que o Príncipe das Trevas pudesse se pronunciar da mesma forma que os porta-vozes do Senhor dos Justos. No passado, os ruminantes clericais tiveram a liberdade de definir “bem” e “mal” como bem entenderam e alegremente atiraram para o esquecimento todos aqueles que discordaram de suas mentiras – verbalmente e algumas vezes fisicamente também. (...)  Agora os enfadonhos manuais da hipocrisia não são mais necessários: para reaprendermos a Lei da Selva precisaremos apenas de uma pequena e esbelta diatribe. Cada verso é um inferno. Cada palavra uma língua de fogo. As chamas do Inferno queimam ferozes... e purificam! Comece a leitura e aprenda a Lei."
Considerações: 
O Livro de Satan, A Diatribe Infernal é simbolicamente associado ao elemento fogo, versa sobre o comportamento do forte e a Lei da Natureza e apresenta satanismo de modo literário por meio de versos divididos em V atos.
É o livro de origem mais polêmica da Bíblia Satânica.  Tudo indica que de fato seus versos são plágio de um obscuro tratado escrito em 1896, sob o titulo “Might is Right”por Ragnar Redbeard (possivelmente um dos pseudônimos de Jack London), que por sua vez foi inspirado no reboliço causado por Nietzsche e Darwin no século 19.
LaVey plagiou os versos diretamente escolhendo segmentos de diferentes seções do livro original e fazendo leves mudanças nos versos para corrifir o que ele considerou erros na lógica e consistência de Might is Right. Hoje o Livro de Satã também é recitado em diversas cerimônias satânicas seja em parte ou na íntegra.
A palavra 'Lei' está capitalizada no final do prefácio do Livro de Satã, e seja proposital ou por acaso, isso não é irrelevante, sendo possivelmente uma referência velada ao trabalho de Aleister Crowley. Realmente, a Lei de Thelema reflete-se na Lei do forte e na alegria do mundo, entre outras similaridades encontradas com o Livro de Satã. Curiosamente o Livro concebido por Aleister Crowley também tem uma autoria controversa.


I.Ato I, o Intróito Diabólico
Citação Chave:  "Nesta árida desolação de aço e concreto eu ergo minha voz para que você possa ouvir. Eu gesticulo para o Ocidente e para o Oriente. Para o Norte e para o Sul eu faço um sinal proclamando: Morte aos fracos, prosperidade para os fortes! (...) Eu demando razões que justifiquem sua regra de ouro e questiono os porquês e as utilidades de seus dez mandamentos. (...) Eu encaro os olhos apáticos de seu temível Jeová e o arrasto pelas barbas; ergo então um machado e parto em dois seu crânio devorado por vermes! Eu lanço aos ares os conteúdos espectrais de sepulcros filosóficos insignificantes e gargalho cheio de sarcasmo e ira."
Considerações:
A cosmovisão do Livro de Satã, e consequentemente de todo o Satanismo é essencialmente espartana e isso fica bastante claro logo no primeiro verso do Livro de Satã. Desconhecendo o ideal da individualidade, Esparta tinha como seu principal objetivo fazer de seus cidadãos soldados, bem treinados, corajosos e obedientes às autoridades e capazes de manter a segurança da cidade. No Satanismo onde não há autoridade externa, o indivíduo é ele mesmo a cidade que deve defender, o governador que decide e o soldado que esta sempre pronto para lutar. Portanto, entende-se que pesquisar e conhecer um pouco da vida em Esparta, assim como quaisquer outras filosofias de vida militares pode ser de grande valia para os Satanista.
Mas será que isso contradiz o hedonismo sugerido mais para frente por LaVey? Afinal, como o militarismo espartano pode conviver com a indulgência e o hedonismo?  Veremos que tudo se explica quando entendermos mais a frente  que Hedonismo não é esperar que a vida seja só prazer, mas é sim saber lidar tanto com o prazer como com a dor da melhor maneira possível. A vida afaga e machuca a todos indiscriminadamente. Assim, quem não está preparado para suportar as batalhas que ela apresenta perecerá e não terá mais oportunidade de desfrutar dos momentos bons que viriam no futuro. A Alegria portanto vem de mãos dadas com a Força.
O objetivo de todo o Livro de Satã é expurgar qualquer mentalidade abraamica da psique do satanista. Compare os versos da citação com a seguinte passagem do Livro da Lei, de Aleister Crowley:


III


51. Com minha cabeça de Falcão eu bico os olhos de Jesus enquanto suspenso na cruz.


52. Eu bato minhas asas na face de Mohammed & o cego.


53. Com minhas garras Eu arranco a carne do Hindu e do Budista, Mongol e Din.


54. Bahlasti! Ompehda! Eu cuspo em seus credos crápulas.


55. Que Maria inviolada seja despedaçada sobre rodas: que por amor a ela todas as mulheres castas sejam desprezadas entre vós. 
A motivação e caráter da Biblia Satânica é o mesmo, pois declaram uma mesma Lei da qual nasceu ma nova religiosidade  que  só é possivel após o completo abandono dos credos, dogmas e medos anteriores.

Ato II,Inversão de Valores

2. Eu questiono a todas as coisas. Enquanto fico diante das fachadas ulceradas e ardilosas de seus arrogantes dogmas morais, escrevo sobre elas com letras ardendo de escárnio: Olhem e vejam! Tudo isto é mentira!
3. Agrupem-se ao meu redor, Oh! desafiadores da morte, e a terra será de vocês, para ser usada e usufruída.
4. Durante muito tempo foi permitido que mãos mortas esterilizassem pensamentos vivos![2]
5. Durante muito tempo certo e errado, bom e mal foram pervertidos por falsos profetas!
6. Nenhuma crença deve ser aceita tendo como autoridade uma natureza “divina”. Religiões devem ser questionadas. Nenhum dogma moral deve ser aceito como verdadeiro – nenhum padrão de medida deificado. O sagrado não é inerente a códigos morais. Assim como os ídolos de madeira do passado eles também foram criados por mãos humanas, e o que o homem faz ele pode destruir!
7. Aquele que é cauteloso em acreditar em qualquer e todo tipo de coisa possui um grande conhecimento, pois acreditar em um princípio falso é o início de toda a tolice.
8. Toda nova era tem como a mais importante das tarefas criar novos homens para determinar
seus novos horizontes, para liderá-la ao sucesso material – para despedaçar os cadeados e correntes de costumes mortos, enferrujados pelo tempo, que reprimem sua expansão saudável. Teorias e idéias que podem ter significado vida e esperança e liberdade para nossos antepassados podem significar destruição, escravidão e desonra para nós hoje!
9. Quando o mundo muda nenhum ideal humano permanece certo![3]
10. Então sempre que uma mentira criar um trono para sim mesma, deixe que seja atacada sem piedade ou culpa, pois sob o domínio de uma hipocrisia indecente ninguém pode prosperar.
11. Deixe que os sofismas estabelecidos sejam destronados, desarraigados, queimados e destruídos pois são uma ameaça real para toda forma verdadeira de ação nobre e pensamentos dignos!
12. Que sempre que se provarem através da prática que uma alegada “verdade” não passa de ficção, deixe que a atirem sem cerimônias no grande vazio, junto com os outros deuses mortos, impérios mortos, filósofos mortos e escombros e destroços sem utilidade![4]
13. A mais perigosa de todas as mentiras entronadas é a sagrada, a santa, a mentira privilegiada – a mentira que todos acreditam ser uma verdade modelo. Ela é a mãe fértil de todos os outros erros e desilusões. É uma árvore de insensatez com centenas de galhos e milhares de raízes. É um câncer social!
14. A mentira que todos sabem ser uma mentira já está a meio caminho de ser erradicada, mas a mentira que é aceita como verdade até por pessoas inteligentes – a mentira que foi inculcada em uma criança nos joelhos de sua mãe[5] – é um inimigo mais perigoso de se enfrentar do que uma pestilência que se aproxima lentamente!
15. As mentiras populares sempre foram as mais poderosas inimigas da liberdade pessoal. Existe apenas uma maneira de lidar com elas: Extirpá-las, como se fossem um câncer. Exterminá-las a partir da raiz até não restar um galho que seja. Aniquile-as ou elas nos aniquilarão!



[1] No começo do segundo ato do Livro de Satã, o autor ironiza a cristandade: "Observem o crucifixo; o que ele simboliza? Incompetência inerte dependurada em uma árvore.". É claro que outras abordagens cristãs são possíveis, por isso é importante deixar claro que o cristianismo que está sendo aqui criticado é aquele que combate a própria vivencia terrena. O cristianismo que proíbe as galas do mundo com sua moral e foge das misérias do mundo com sua metafísica. Em muitos sentidos o cristianismo paulino é a negação da própria vida, não é a toa que seu maior símbolo seja o de um instrumento de tortura e o seu maior ícone seja o de um executado.  A natureza material e os desejos carnais são por ele vistos como inimigos a serem sempre combatidos ou superados até o inevitável desfecho. Ora qual não é o fim daquele que combate sua própria vida senão sua própria morte? É por isso que Nietzsche afirma categoricamente em O Anticristo que: “O Evangelho morreu na cruz.” .
[2] É um engano pensar que a negação da vida material e terrena começou com o cristianismo de Paulo de Tarso.  A negação do prazer, e a sublimação da dor atingiu sua plenitude com o domínio da Igreja Romana, mas existe antes disso toda uma história de fuga do mundo com ingredientes que vão do dualismo zoroástrico a escatologia judaica. Conhecer todas estas fontes das quais beberam a decadência, é uma obrigação para o Satanista, na medida em que não se pode combater aquilo que não se conhece. Um destaque em especial é devido a herança recebida da metafísica platônica:  “As matrizes socráticas, as quais construíram o homem teórico, moral, ansioso por uma verdade absoluta e as fundamentações platônicas, que transformaram esse homem teórico em ideal de ser humano, mas para viver num mundo perfeito, fora de suas sensações ‘enganosas’, tornaram o mundo concreto do presente em um peso. O mundo foi substituído por uma fábula e a vida tornou-se algo que cansa os homens”. – Nietzsche, o Anticristo.
[3] Não há moral eterna e imutável. As doutrinas religiosas e idealistas que falam dos princípios "eternos e irremovíveis" são ingênuas e inexatas. "As idéias do bem e do mal - dizia Engels - diferem de povo para povo, de geração para geração, e, não poucas vezes, chegam a se contradizer abertamente". Os jesuítas que chegaram ao Brasil com Tomé de Souza em 1549 e daqui sairiam por expulsão em 1759 (M.de Pombal), segundo a opinião expressa pelo Padre Nóbrega, os nativos brasileiros eram pecadores inveterados. "Cometiam todos os pecados e não obedeciam um só mandamento de Deus e muito menos da Igreja. Talvez nem mesmo tivessem alma. Surgiu então a crença generalizada de que "não existia pecado ao sul do Equador.”
No livro Teoria Materialista da História de F. V. Konstantinov lemos que nas sociedades primitivas, onde as forças produtivas era muito baixas, a fome crônica obrigava o homem a matar, e, às vezes, a devorar os velhos e as crianças. Nada disso era imoral na época. Durante a escravidão o domínio entre senhores e escravos era plenamente aceito e foi uma regra de convívio que regeu muitas sociedades durantes séculos. No feudalismo, a fidelidade e a honra de se manter os contratos com os senhores feudais era o mais alto valor moral e a vida de orgias, o parasitismo e a ociosidade da nobreza era considerados como perfeitamente lícitas. Foi só a burguesia posterior dos séculos XVI, XVII e XVIII que imbuída do espírito empreendedor, olhou com desprezo os vícios feudais, de esbanja­mento, indolência, ociosidade, e pregava como alternativa a moral puritana, da parcimônia e a laboriosidade. Mais tarde, porém, a mesma burguesia, ao converter-se ao poder mudou também os seus princípios morais. Hoje o ócio e o parasitismo já não são considerados vícios, mas privilégios.
Na sociedade do consumo em massa o imoral não é ir contra a Igreja, a nobreza, ou os senhores feudais, mas sim discordar da moda, das propagandas e da televisão. O novo poder está nas mãos da mídia que determina tanto quem será eleito como no que as pessoas devem acreditar. Hoje em dia alguém quem não assiste televisão e não consome da maneira indicada, quem vai contra as informações, as “verdades” difundidas,  é visto com a mesma estranheza com que era visto um aldeão medieval que não participasse da eucaristia.
A moral de uma sociedade é definida pela classe dominante. E assim como o poder muda de mão em mão também as certezas de conduta anteriores passam a ser questionadas. Como foi bem dito no Manifesto Comunista, tudo o que era sagrado é profanado, tudo o que era sólido se desmancha no ar.
[4] “Honestidade não é um dever social, não é um sacrifício pelos outros, mas uma das virtudes mais egoistas que um homem pode praticar; trata-se de rejeitar sacrificar a realidade da existência em prol das ilusões de consciencia dos outros.” - Atlas Strugged, Ayn Rand
[5] A mais brilhante técnica de propaganda mostrar-se a inútil ao menos que um princípio fundamental seja mantido em mente – tudo deve ser simplificado a uns poucos pontos que devem ser repetidos de novo e de novo. Propaganda deve portanto ser simples e repetitiva. (...) Uma mentira repetida o suficiente transforma-se em verdade. Se você diz uma grande mentira e persiste em repeti-la, as pessoas eventualmente acreditarão nela. - Joseph Goebbels, Ministro de Propaganda do Terceiro Reich




Ato III, Lex Talionis
Citação Chave: “Por que eu não deveria odiar meus inimigos – se amá-los não fará com que sintam compaixão por mim? É natural que inimigos façam o bem um ao outro – e O QUE É O BEM? Pode a vítima ferida e ensangüentada  “amar” as mandíbulas encharcadas de sangue que a despedaça, membro por membro?" (...) Odeie seus inimigos, com todo o seu coração, e se um homem lhe bater em uma das faces ESMURRE ele na outra! Acerte-o com força e sem piedade, pois a auto preservação é a maior de todas as leis! Aquele que oferece a outra face é um cão covarde!"
Considerações:
O terceiro ato do livro de Satã, versa sobre a Lei de Talião contraponto a reciprocidade ao perdão e questionando os conceitos pupulares de bem e o mal. De modo semelhante a rápida menção no Livro de Satã, o biólogo Charles Darwin, testemunhou a amoralidade na vida selvagem e igualmente concluiu, como qualquer outro observador da natureza que realmente existe "muita miséria no mundo". Em suas próprias palavras: "Não consigo persuadir-me de que um Deus de bondade e onipotência tivesse criado deliberadamente as Ichneumonidae [vespas que capturam lagartas e as paralisam para que suas larvas vivam nelas como parasitas e finalmente as matem] com a intenção expressa delas se alimentarem do corpo de lagartas vivas, ou tivesse criado gatos para perseguirem ratos."
A indignação do autor se expressa na frase "Ama teus inimigos e faz o bem para aqueles que te odeiam e te usam – esta não é a desprezível filosofia dos servos que sorriem sempre que levam um tapa?" Sobre isso é Rita Nakashima e Rebecca Ann Parker, respectivamente uma professora universitária e uma pastora metodista doutoradas na Episcopal Divinity School of Harvard, publicaram em seu estupendo artigo, “Podem estes Ossos Viver? Críticas Feministas a Redenção”. Por muito tempo os teólogos tem prendido suas vítimas em ciclos seguidos de violência e dor, por representar o sofrimento e a vitimização como uma necessidade moral e espiritual.  Segundo as autoras a teologia da redenção faz isso de diversas maneiras:


1 - Ela valoriza o silêncio ao invés do protesto
2 - Valoriza a obediência ao invés da resistência à autoridade injusta
3 - Cultiva a passividade e posterga a mudança ao nos pedir que submetamos a violência agora, com recompensas em uma vida futura.
4 - Privilegiam aqueles que infligem e se beneficiam da violência , porque a redenção dos pecadores é mais importante do que o inocente que sofre.
5 - Eleva a inocência ao nível de grande virtude moral, ao invés do discernimento moral consciente, baseado na sabedoria e na reflexão e
6 - Protege os perpetuadores do mal ao louvar as vitimas como redimidas e subordinando-as ao drama da salvação.
É animador o fato de os próprios cristãos começarem a discutir as conseqüências da teologia da redenção. Mas é ainda mais animador inverter estes seis atestados e perceber que assim chegamos a algo bastante próximo as Nove Declarações Satânicas.


Essa postura de ódio aos inimigos é a mesma criticada com propriedade em uma entrevista em 1963, Malcolm X onde falou sobre política de não violência:  “Todo o negro que ensina o outro negro oferecer a outra face, desarma-o. Todo negro que ensina o outro a oferecer a outra face diante do ataque rouba-lhe o direito divino, seu direito moral, seu direito natural, o direito natural à defesa. Todos os seres de natureza têm esse direito e têm razão de exercê-lo. Homens como King têm por profissão ensinar os negros a ‘não reagir’. Ele não lhe diz para ‘não lutarem entre si’. ‘Não reajam contra o homem branco’ é a essência de sua pregação, pois adeptos de King matar-se-ão entre si, mas nada farão em defesa própria contra os ataques do homem branco. (...) Nós não somos pela violência. Somos pela paz. Todavia, as pessoas que combatemos empregam a violência. E não se pede ser pacífico diante dessa gente.” 
Ou seja, umasta postura é bem diferente da de Martin Luther King que defendia a não-violência e resistência pacifica. Mas de qualquer forma pouco depois desta entrevista ambos os líderes negros foram assassinatos assim como diversos militantes dos ‘Panteras Negras’. Isso empurrou o movimento afro-americano para a despolitização conformista, não tanto para eliminar os negros - muito úteis ocupando o grande número de empregos sub-remunerados – mas simplesmente controlando-os, aterrorizando-os, discriminando-os e sugerindo-lhe outras vias de "contestação". Disso resulta a posição atual dos negros americanos e consequentemente no resto do mundo todo. A lição de reação ensinada por Malcolm X foi esquecida e os negros aprenderam a viver e tolerar a discriminação. E assim vai ser até que os negros parem de dar a outra face e tratem os indivíduos que os maltratam da forma como eles realmente merecem.
Mesmo a não violência e desobediência civil pregada por Gandhi era uma forma de violência contra seus agressores ingleses. Gandhi alertava a todos que o seguiam que muitos poderiam ser torturados e mortos e quando lhe indagaram sobre a melhor forma de combater a violência física ele respondeu que contra a violência física existe apenas uma resposta, a violência espiritual e que a maior violência que se pode oferecer é o amor. Os ingleses que executavam os indianos ficavam tão chocados que abandonavam seus postos ao ver que eles simplesmente marchavam para a morte sem reagirem. Mesmo ai é interessante notar que a outra face não era oferecida esta forma “pacífica” de protesto era apenas uma forma de se opor contra um inimigo comum muito mais poderoso e não uma forma de conformismo.

Ato IV,Vida Mundana

Citação Chave: "A vida é a grande indulgência – a morte a grande abstinência. Então aproveite ao máximo a vida – AQUI E AGORA! Não existe um paraíso de glorioso esplendor ou um inferno onde os pecadores queimam. Aqui e agora é nosso local de tormento! Aqui e agora nosso momento de alegria! Aqui e agora é nossa oportunidade! Escolha então este dia, esta hora, pois nenhum redentor jamais viveu! Diga a seu próprio coração: “Eu sou meu próprio redentor”."
Comentário: 
O assunto dominante deste ato é a Vida Mundana. Ou seja, a vida do mundo, a vida terrena e contraposição a vida do além e as promessas de todas as outras religiões. Resumindo, o Satanismo não devota tempo ou material demasiado para a possibilidade de uma existência após a vida, ele deixa essa possibilidade ou impossibilidade, aberta para a crença pessoal de cada Satanista. Seja qual for esta visão do pós-morte o Satanista encarará a vida que vive como a única vida que ele tem agora, por isso fará de tudo para a levar de maneira satisfatória.
O quarto ato do Livro de Satã também fala sobre o conceito da indulgência satânica, que mais tarde será intelecualizado por LaVeu no capítulo "Indulgência... NÃO Compulsão" do Livro de Lúcifer." Em poucas palavras para o satanista o temro Indulgência tem a mesma significação que Verdadeira Vontade tinha para Aleister Crowley, no Manual do Satanista Morbitvs Vividvs elucida:
A Verdadeira Vontade não tem nada haver com compulsão muito menos abstinência, pois é a medida verdadeira de toda a estrela. O desejo advindo da compulsão é um risível capricho do id, o comportamento oriundo da abstinência é mera sujeição á sociedade. Em contrapartida, indulgência é a sublime manifestação de Baphomet (Logos/Cosmos) no indivíduo. A indulgência é a articulação de quando as coisas acontecem no momento em que os indivíduos se articulam ao movimento natural das coisas, como um animal do campo ou um bebê.

Ato V, Bençãos e Maldições Satânicas
Citação Chave: "Abençoados são os forte, pois eles conquistarão a Terra – Amaldiçoados são os fracos, pois herdarão a escravidão! (...) Abençoados são os vitoriosos, pois a vitória é a base de tudo que é certo – Amaldiçoados são os derrotados, pois serão vassalos eternos! (...) Três vezes amaldiçoados sejam os fracos cuja insegurança os tornam vis, pois eles servirão e sofrerão! O anjo da auto ilusão está acampado na alma dos “justos” – A chama eterna do poder através da alegria habita na carne do Satanista!"


Comentário: O último ato do Livro de Satã é uma série de benções e Maldições que visam parodiar e corrigir os conceitos do Sermão da Montanha, encontrado nos evangelho cristão. O conceito do direito natural dos fortes que é proclamado foi compreendido por todos os grandes líderes militares da história. Adolf Hitler, em seu livro “Mein Kampf”, no terceiro capítulo escreveu: “Se na luta pelos seus direitos uma raça é subjugada, significa isso que ela pesou muito pouco na balança do destino para ter a felicidade de continuar a existir neste mundo terrestre, pois quem não é capaz de lutar pela vida tem o seu fim decretado pela providência. O mundo não foi feito para os povos covardes.” O satanismo não lida com povos, mas com indivíduos, mas o mesmo pode ser dito quanto a eles.
"Abençoados são os vitoriosos, pois a vitória é a base de tudo que é certo". Este é outro verso importante, pois guarda a mesma temática do titulo original “Might is Right”, em outras palavras, o “forte está sempre certo”.  São os poderosos os únicos capazes de dizer o que é certo e errado na prática. Certamente teríamos uma visão bem diferente do que foi o III Reich se Hitler tivesse sido vitorioso. Nas palavras de Al Capone, “você consegue muito mais, com uma palavra amável e um revólver do que somente com uma palavra amável.” Stalin dizia que os comunistas jamais reconheceriam nenhuma lei moral que prejudicasse os planos da revolução. Hoje entendemos que, Hitler é um monstro, Capone um criminoso e Stalin um facínora, mas isso só reforça o antigo ditado militar que ensina  que “a história é contada pelos vencedores.”
Os padrões de bem e mal, moral e imoral, justo e injusto são definidos por aqueles que sobreviveram aos conflitos, derrotaram seus inimigos e conquistaram poder, dinheiro e domínio sobre as massas e criam os métodos de punição para aqueles que se opõe a eles. Nenhuma lei guiou a humanidade até hoje senão a Lei do mais forte. Nos primórdios da história quando os homens se submetiam à força bruta de seus líderes, esta relação era mais clara e óbvia. Hoje se submetem à lei oficial de seus países, que nada mais é do que esta mesma força mascarada.
"Três vezes amaldiçoados sejam os fracos cuja insegurança os tornam vis". Esta passagem, por fim pode nos remeter diretamente à teoria do ressentimento dos vencidos, da moral dos escravos proposta por Friedrich Nietzsche. O modelo em que a hierarquia social nasce de um duelo onde o vencido para se manter vivo aceita ser escravo e reconhece no vencedor o seu senhor já fora identificado por Hegel. Nietzsche contudo extrai deste duelo outras conseqüências. Em dado momento da história, mais especificamente na Palestina durante a destruição do segundo Templo de Salomão, um povo foi mais uma vez vencido por outro, mas desta vez, mais do que em qualquer momento anterior destilou-se o veneno do ressentimento. Tudo aquilo que era associado aos vencedores romanos, o que quer que fosse forte, nobre, altivo, saudável, corajoso, passou a ser denunciado como "mau".  E tudo o que era vil, fraco, vencido, ferido e covarde, começou a aparecer como sendo "bom". Os escravos, não podendo ganhar a batalha, mudam os próprios valores. Séculos mais tarde, esta artimanha acabou por transferir-se e ser institucionalizada aos próprios romanos, curiosamente no seu período de maior decadência.




(Ar) Livro de Lúcifer
A Iluminação



Citação Chave: "O deus Romano Lúcifer era o portador da luz, o espírito do ar, a personificação da iluminação. (...) A simples verdade nunca tornou ninguém livre. É a DÚVIDA que traz a emancipação da mente. (...) Se é para se acreditar nestas acusações teológicas de que o Diabo representa a hipocrisia, então a conclusão lógica é que ELE, E NÃO DEUS, ESTABELECEU TODAS AS RELIGIÕES ESPIRITUAIS E  ESCREVEU TODAS AS BÍBLIAS SAGRADAS! Quando uma dúvida é seguida por outra a bolha já enorme, graças ao acúmulo de falácias sem fim, ameaça estourar. Para aqueles que já duvidam dessas supostas verdades este livro é uma revelação. Então Lúcifer terá se erguido. Agora é o momento para dúvidas! A bolha da hipocrisia está estourando e soa como o rugido do mundo!"
Considerações:
O Livro de Lúcifer: a Iluminação é o segundo livro da Bíblia Satânica e é simbolicamente associado ao elemento Ar. Depois do forte apelo emocional do livro anterior LaVey baixa o tom e trata o satanismo de um ponto de vista racional. embora todo momento apele a iconografia e a estética diabólica. O Livro de Lúcifer busca traçar logicalmete uma filosofia de vida baseada no egoísmo e no materialismo e é por assim dizer o grande manifesto intelectual de LaVey. Impossível não enxegar os paralelos com a filosofia nietzchiana e o objetivismo. O livro é dividido em vinte ensaios, cada um apresentando um componente vital da arquitetura ideológica do satanismo.





Procura-se Deus Vivo ou Morto



Citação Chave: "O conceito de “Deus”, da forma que é interpretada pelo homem, já sofreu tantas mudanças durante os séculos, desde que foi criada, que o Satanista simplesmente aceita a definição que melhor lhe convém. O homem sempre criou seus deuses e não o contrário. Para alguns Deus é benigno – para outros  atemorizante. Para o Satanista “Deus” – seja como for chamado ou mesmo se não tiver nome algum – é um fator de equilíbrio da natureza e não algo preocupado com o sofrimento. Esta força poderosa que permeia e equilibra todo o universo é impessoal demais para se importar com a alegria ou a desgraça das criaturas feitas de carne e sangue que habitam este amontoado de pedras e terra que flutua no espaço."
Considerações:
Neste capítulo Lavey propõe uma aproximação do Satanismo quanto a problemática da existênciae natureza da divindade. O resultado é uma aproximação utilitarista da abordagem junquiana de Deus. Carls Gustav em "A vida simbólica" afirma que “Encontramos muitas representações de Deus, mas o original ninguém consegue encontrar. Para mim não há dúvida que o original se esconde atrás de nossas representações, mas ele nos é inacessível. Jamais estaríamos em condições de perceber o original, porque deveria ser antes de mais nada traduzido em categorias psíquicas para tornar-se  de alguma forma perceptível.  E presumo que a diferença entre o ser humano e o criador de todas as coisas é incomensuravelmente maior do que entre um ser humano e uma barata. Porque seriamos tão imodestos a ponto de supor que poderíamos encerrar um ser universal dentro dos estreitos limites de nossa linguagem?”
O principal  argumento sobre a inexistência do Deus Vulgar apresentado pelas demais religiões formulado por Hume é brevemente citado. Hume foi a primeira figura de destaque na história intelectual moderna a fazer um ataque devastador sobre a religião e a teologia. No décimo capítulo de seus Diálogos encontramos este argumento, que está resumido e esquematizado abaixo:
1 - Deus seria um ser onipotente, onisciente e infinitamente bom.
2 - Um ser onipotente e onisciente pode eliminar todo mal e sofrimento do mundo, e sabe como fazê-lo.
3 - Um ser infinitamente bom deseja eliminar todo o mal e sofrimento do mundo
4 - Se Deus existe, não há mal e sofrimento no mundo
5 - No mundo há mal e sofrimento
6 - Consequentemente Deus não existe.
A lógica irrefutável e os golpes intelectuais de Hume foram tais que as religiões, em especial para a cristandade que  até hoje seus adeptos mais cultos sentem seus efeitos. Depois dele a única opção dos teístas foi aceitar que não há justificação racional para crenças religiosas populares, como fez Hume ou então tentar a todo custo refutar estas críticas como tem tentado os teólogos de todas as linhas desde então.
“Deus está morto”. A referência à Nietzsche é clara. Uma leitura de Gaia e a Ciência (125)  seria bem sadia para esta reflexão. Resumidamente, Deus não pode estar morto se jamais esteve vivo. O que está morta é a representação passada que a humanidade tinha de Deus, a “idéia de Deus” é que está morrendo. Contrastando com a mentalidade dos séculos anteriores onde a divindade patriarca-criadora-abrahâmica era o centro do mundo, agora ao menos o ocidente começou a descobrir um novo modo de viver e pensar sobre a vida. Deixando de lado os antigos valores e crenças a humanidade “matou" o Deus dos séculos passados. De fato ele ainda perturba, como Nietzsche disse,  “por séculos ainda veremos sua sombra”. Mas LaVey está certo também, Sua saúde não é mais a mesma.
No entanto, Michael Aquino, fundador do Templo de Set alerta em seu livro “Church of Satan”: “Se o Satanista vê a si mesmo como deus, então eu perguntaria, onde foi parar Satã?” Deve ele ser considerado um mero símbolo? Num senso vulgar, sim. Não haveria sentido para o Satanista livrar-se de Deus simplesmente para colocar outro Deus no seu lugar, tenha ele ou não chifres. Mesmo num sentido alegórico esta seria tanto a destruição de Deus como a destruição dos próprios princípios satânicos
Não deve apenas o Satanista evitar que o Diabo tome o trono de Deus, mas deve também fazer questão de que ele mesmo fará isso.  Ele deve se livrar de Deus, mas simultaneamente deve preservar a inocência de espírito que permitiu em primeiro lugar reconhecer os horrores que um deus externo pode fazer.
Satã é o símbolo de tudo aquilo que o Satanismo busca e representa. Mas este simbolismo é apenas uma parte da verdade. Já que o ser humano pode agir e pensar contra este "fator de equilíbrio" identificado por muitos como Deus, precisamos identificar qual é a fonte para esta nossa habilidade. Este é um dos “segredos” da Igreja de Satã que foram expostos pelo Templo de Set, e relaciona-se perfeitamente com a visão teosófica do Diabo.  Para Michael Aquino esta fonte é o que faz do Satanismo algo muito maior do que um simples exercício psicodramático de narcisismo. É a inteligência da humanidade que personifica o príncipe das Trevas - não como um símbolo ou alegoria, mas como um ser que toma consciência e adquire uma mente que se destaca e se reconhece dentro do universo. Para H. P. Blavatsky “está provado que Satã, ou o Dragão Vermelho... e Lúcifer, ou “O Portador da Luz” estão em nós:  é a nossa Mente. Nossas mentes que são como luzes brilhando até onde podem numa escuridão infinita. Como se fossemos estrelas. Como portadores de luz. Como luciferes.
Em harmonia a isso, Friedrich Nietzsche, em "Para Além do Bem e do Mal", declara nos parágrafos 9 e 37 de sue livro “Ó nobres estóicos, quereis viver “de acordo com a natureza”? Que falsas palavras! Imaginai um ser como a natureza, pródigo o mais possível, o mais possível indiferente, sem intenções nem considerações para com ninguém, sem piedade nem justiça, fecundo e árido e incerto ao mesmo tempo, imaginai a própria indiferença como força. Como poderíeis viver segundo essa indiferença? Viver  não é precisamente um querer-ser-diferente dessa natureza? Viver não consiste em querer avaliar, preferir, em ser parcial, limitado, diferente? (...) Mas como? No falar coloquial isso não quereria dizer: Deus está refutado – mas não o Diabo? Pelo contrário! Pelo contrário meus amigo! E, que diabo, quem vos obriga a falar em linguagem coloquial?”
Equilibrando-se entre o ateísmo e o agnósticismo LaVey continua o capítulo e de cara acusa as orações judaico-cristãs de serem hipócritas e fantasiosas. É preciso no entanto entender o contexto religioso em que estamos inseridos. O Protestantismo é a corrente do Cristianismo que surgiu com a Reforma Protestante, no século XVI, iniciada pelo teólogo alemão Martinho Lutero. A proposta defendida por Lutero era a separação da Fé Cristã com a Igreja Católica e a reaproximação com o Cristianismo Primitivo. Condenando a venda de indulgências pela igreja e a degradação moral do clero ele fixa na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, no seminário onde lecionava, 95 teses questionando dogmas, preceitos e práticas adotados pelo Vaticano. Essas teses são consideradas heréticas pela Igreja Católica e em 1519 Lutero corta laços com o catolicismo ao negar o primado do Papa. Em 1521 é excomungado. As teses de Lutero encontram receptividade em outros países da Europa e acabam por gerar um movimento pela reforma da Igreja. O nome protestante é atribuído, na época, aos partidários da reforma que protestam contra a Dieta (assembléia convocada pelos reis) de Espira, em 1529.
Apesar de perseguido pelo Vaticano, Lutero é amparado pela aristocracia, traduz a Bíblia para o alemão e funda uma nova igreja. Ele abole a confissão obrigatória, o culto aos santos e à Virgem Maria, o jejum e o celibato clerical. Dos sete sacramentos católicos, ele só aceita os do batismo e da eucaristia. Nem todas as suas teses, porém, são aceitas por seus aliados em outros países e, em razão disso, o protestantismo dá origem a diferentes correntes de pensamento teológico e ao nascimento de novas igrejas cristãs, como a dos seguidores do francês João Calvino e do inglês John Wesley.
Diz-se que Lutero era arrogante em relação a quem quer que o contradissesse, chegando a agredir o opositor com o mesmo turpilóquio do qual se servia para exorcizar os demônios, deixando escandalizados alguns dos mais tolerantes, livres e despreconceituosos intelectuais da Europa. Erasmo de Roterdã descreve a pregação de Lutero com as seguintes palavras: “Gritam sem parar: Evangelho! Evangelho! Mas gostaria de ver explicado só esse. [...] Vejo novos hipócritas, novos tiranos, mas não vejo uma centelha de espírito evangélico.”
Thomas Morus, autor de Utopia, escreve: “Lutero só fala de Latrinas, de esterco e de lama, usando a língua nos modos mais ultrajantes. Se continuar a servir-se dessa linguagem da prostituição, e a encher a boca de água suja, urina e defecação, outros poderão adequar-se ao seu estilo ou fazer até pior.” Dois séculos mais tarde Voltaire escreve que: “Não se pode ler sem um sorriso de piedade o modo como Lutero trata com a maior rudeza seus adversários, principalmente o Papa.”
Os protestantes, também chamados de evangélicos, dividem-se atualmente em inúmeros grupos: Igreja Luterana, Igreja Presbiteriana, Igreja Episcopal Anglicana, Igreja Batista, Igreja Metodista, os Pentecostais como a Congregação Cristã, Assembléia de Deus, Igreja do Evangelho Quadrangular, os NeoPentecostais como a Igreja Universal do Reino de Deus, Sara Nossa Terra e Renascer em Cristo além da Igreja Adventista, da Mórmon (Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias) e das Testemunhas de Jeová.
Não importa sua religião, sempre haveram muitas pessoas dispostas a dizer que você está errado e deve pagar com dor por isso.  Nas palavras de Ayn rand em Atlas Shrugged, "Danação é o começo de sua moralidade; destruição é seu propósito, seu meio e seu fim.  Seu código começa condenando o homem como mal, e então demanda que ele pratique o bem, já definido como impossível. Exige então como sua primeira prova de virtude que ele reconheça sua própria depravação sem ter qualquer provas para isso. Demanda que comece não com um padrão de valor mas com um padrão do mal, que é ele mesmo, por meios quais ele deve alcançar o bem, o bem que não ele não é."
Não será difícil ainda para qualquer leitor encontrar discrepâncias na Bíblia Cristã, especialmente entre o Antigo e o Novo Testamento. Pudera, este livro foi escrito por quarenta homens diferentes num período que se estende por mais de 1.600 anos só atingindo sua atual forma após o Concilio de Trento, organizado pela Igreja Católica em 1546. Sendo o assunto aqui a incoerência na discussão religiosa vale lembrar que não há divergências entre católicos e protestantes quando ao cânon do Novo Testamento. Ou seja, o conceito de Sola Scriptura dos protestantes é em parte herdeiro direto dos ditames da tradição romana, e eles enfrentam o Catolicismo usando os mesmos versículos que foram selecionados pela tradição católica dentre tantos possíveis apócrifos até o século XVI.
Apesar de todas estas divisões, com uma religião mandando a outrapara o inferno, a história é clara: quando em dúvida o Diabo fica com o judeu.  “Tendes por pai o Diabo, e só fazeis a vontade de vosso Pai” João 8,44. Foi no Novo testamento que se deu o inicio do processo de diabolização do povo judeu. Sendo os assassinos do salvador, foram durante toda a Idade Média, acusados de assassinato, missas negras, infanticídio, blasfêmia, feitiçaria e pactos infernais. O último judeu  queimado na Inquisição morreu em 1826 mas de lá para cá não é exagero afirmar que não se passou uma década sequer sem que alguém desse aos judeus o nome do Diabo. Dos progrons da Rússia e Polônia ao genocídio de Auschwitz, da forja dos afamados “Protocolos dos Sábios de Sião” ao crescente odio árabe. Os comunistas diabolizaram o judeu por sua economia, os nazistas por sua raça, os muçulmanos por sua religião.

O capítulo todo revela portanto porque o verdadeiro Satanista apesar de dever conhecer as artimanhas das outras religiões  não perder seu tempo combatendo o cristianismo ou qualquer outra religião. A cristandade já está morrendo, ao menos na medida em que a lagarta deve morrer para nascer a borboleta. As transformações sociais e nos indivíduos estão fazendo antigos dogmas serem revistos e novas praticas serem adotadas. O melhor mesmo é deixar o cristianismo morrer de morte natural. Não há necessidade de se profanar templos, pois uma coisa só pode ser profanada se for sagrada. E na Nova Era Satânica nada mais o é.


O Deus que você salva,pode ser você mesmo.



Citação-chave: "Todas as religiões de natureza espiritual são invenções do ser humano. Ele criou um sistema inteiro de deuses usando nada mais nada menos do que seu cérebro carnal. Só porque ele possui um ego e não pode aceitá-lo acaba exteriorizando-o na forma de um grande ardil espiritual batizado por ele mesmo de “Deus”. Deus pode fazer tudo aquilo que o ser humano é proibido de fazer – como por exemplo matar outras pessoas, realizar milagres para gratificar a própria vontade, controlar sem ter nenhuma responsabilidade aparente, etc.  Se o ser humano precisa de um deus assim e reconhece esse deus então está adorando uma entidade criada por outro ser humano. Então, pela lógica, ELE ESTÁ ADORANDO A PESSOA QUE INVENTOU DEUS. Não seria muito mais sensato então que este mesmo ser humano adorasse a um deus que tivesse sido criado por ele mesmo ou ela mesma, um deus em harmonia com suas próprias necessidades emocionais – um deus que represente da melhor forma possível o ser físico, feito de carne e osso, que possui o poder mental capaz de criar um deus em primeiro lugar?"

Considerações:
Seguindo o conceito de  "Eu sou meu próprio deus" com uma completa explicação da visão de mundo satânica este capítulo declara que todos os deuses foram criações da mente humana, e adorar um deus externo é adorar o outro ser humano que o criou por tabela. Assim a conclusão de LaVey é que deveriamos criar nossos próprios deuses, a sabe nos mesmos, e então adorá-lo. O resultado obviamente é enxergar a si mesmo como o mais importante de todos os seres e adotar uma visão e comportamento centrados em si mesmo.
Contra uma tendência antiga da sociologia de reduzir todo o aspecto religioso a coerção social (Durkheim) ou as ilusões da superestrutura (Marx), temos em Carl Gustav Jung, a primeira defesa séria de que o dogma é mais uma resposta cultural a uma necessidade interna do que uma resposta interna a uma necessidade cultural. Ou como nas palavras de LaVey, o dogma é uma necessidade. Em ‘Psicologia e Religião’ Carl Gustav Jung expõe que o dogma é uma ferramenta do aparato mental humano, que pode ser observada em todos os indivíduos e povos. Exatamente como os sonhos o dogma reflete a atividade espontânea e autônoma da psique objetiva, isto e do inconsciente. Uma fidelidade tranqüila e relaxada as categorias religiosas pode nos resguardar de uma dinâmica dissolutiva prejudicial a integração com o Self.
Sobre a importância do dogma, basta ver os grandes movimentos sociais do século XX, o romantismo do século XIX e os fenômenos religiosos de todos os séculos anteriores. Quando a isso a leitura de Gustave Le Bon, em "As Opiniões e as Crenças” é reveladora. Segundo ele a fé num dogma qualquer é, sem dúvida, de um modo geral, apenas uma ilusão. Cumpre, contudo, não a desdenhar. Graças à sua mágica pujança, o irreal torna-se mais forte do que o real. Uma crença aceite dá a um povo uma comunhão de pensamentos que originam a sua unidade e a sua força. Sendo o domínio do conhecimento muito diverso do terreno da crença, opô-los um ao outro é tarefa inútil, embora diariamente tentada.

As leis que regem a psicologia da crença não se aplicam somente às grandes convicções fundamentais, que deixam uma marca indelével na trama da história. São também aplicáveis à maior parte das nossas opiniões quotidianas relativamente aos seres e às coisas que nos cercam.

A observação mostra que, na sua maioria, essas opiniões não têm por sustentáculos elementos racionais, porém elementos afetivos ou místicos, em geral de origem inconsciente. Se nós as vemos discutidas com tanto ardor, é precisamente porque elas pertencem ao domínio da crença e são formadas do mesmo modo. As opiniões representam geralmente pequenas crenças, mais ou menos transitórias.

Seria, pois, um erro supor que se sai do terreno da crença, quando se renuncia às convicções ancestrais. Teremos ensejo de mostrar que, as mais das vezes, ainda mais se aprofundou nesse domínio. Sendo as questões suscitadas pela gênese das opiniões da mesma natureza que as relativas à crença, devem ser estudadas de modo análogo. Muitas vezes distintas nos seus esforços, crenças e opiniões pertencem, no entanto, à mesma família, ao passo que o conhecimento faz parte de um mundo inteiramente diverso.

Um dogma e seus casos específicos como Deus, Sobrenatural, Tão, Mística, Magia e realidades últimas em geral, portanto não são simplesmente um fenômeno da cultura para aqueles que nele crê, mas uma demanda feita ao entendimento humano que vem de sua própria orientação biológica.

O Satanista deve contudo entender que isso não implica na veracidade de qualquer dogma, mas apenas reconhece sua existência e importância em nossa configuração psíquica. Novamente em ‘Psicologia e Religião’ Jung escreve: “Incorreria em erro lamentável quem considere minhas observações como uma espécie de demonstração da existência de Deus. Elas demonstram somente a existência de uma imagem arquetípica de Deus e, na minha opnião isso é tudo o que se pode dizer psicologicamente cerca de Deus.”
Segundo Carls Gustav Jung, todos os deuses já adorados e temidos pelo homem são de fato projeções coletivas de algo que existe previamente dentro da mente humana.  Os chamados arquétipos carregam em si as mesmas grandes aspirações e problemas enfrentados pela psique humana. Refletindo uma mesma realidade psíquica, eventualmente os povos criaram formas semelhantes de arquétipos, o que levou Jung a chamá-los também de Imagens Primordiais. Cada época e cada povo aprenderia contudo a trabalhar com estes arquétipos a seu próprio modo, mas Jung identificou que em todos os períodos sempre existiram indivíduos capazes de lidar com os arquétipos de modo mais “identificante”, íntimo e pessoal. Os trabalhos do místico no real sentido da palavra é uma das propostas do Satanismo.

Uma afirmação interessante neste capítulo é que, por mais cética e ateísta que uma pessoa seja, a necessidade de dogmas e rituais será sempre uma constante. Jean Baudrillard,  em A moral dos objetos confirma isso ao lembrar que “para as massas, o Reino de Deus sempre esteve sobre a terra, na imanência pagã das imagens, no espetáculo que a Igreja lhes oferecia. Desvio fantástico do princípio religioso. As massas absorveram a religião na prática sacrílega e espetacular que adotaram. Nenhuma força pode converte-las à seriedade dos conteúdos, nem mesmo à seriedade do código, isso não lhes importa, elas querem apenas signos, elas idolatram o jogo dos signos e de estereótipos desde que eles se transformem numa seqüência espetacular...”  LaVey conhecia essa necessidade de espetáculo e ritual, por isso arquitetou uma série de cerimônias que os satanistas poderiam se dedicar sem desviar sua atenção para mentiras metafísicas. 
Nada obriga uma pessoa a satisfazer estas necessidades adorando um deus externo. Se reconhecermos que os rituais e cerimônias foram artifícios importantes que as religiões utilizam para manter sua fé em uma mentira, então segundo LaVey o mesmo tipo de ritual poderá agora manter sua fé na verdade. Voltando a Jung, os rituais encontrados em todas as expressões culturais da humanidade são, em sua grande maioria, formas de interagir e se aprofundar no relacionamento com os arquétipos de cada civilização.  De fato, como propõe LaVey, nada impede, que isso seja feito de maneira consciente e esta é inclusive a chave para diversas terapias psicanalíticas baseadas no trabalho de Jacob Levy Moreno e outros alunos de Freud.

Algumas Evidências de uma Nova Era Satânica
Citação-chave: "Os tempos mudaram. Líderes religiosos não pregam mais que nossos atos naturais são pecaminosos. Nós não achamos mais que sexo é algo sujo – ou que nos orgulharmos de nós mesmos é algo vergonhoso – ou que desejar algo que outra pessoa possui é errado.” (...) Quando um potro atinge a maturidade se torna um cavalo; quando o gelo derrete é chamado de água; quando o período de doze meses chega ao fim nós seguimos um novo calendário correspondente a este novo período cronológico; quando a “magia” se torna um fato científico nós a chamamos de medicina, astronomia, etc. Quando um nome não é mais apropriado para designar determinada coisa é apenas lógico mudar para um novo que seja mais conveniente. Então por que não seguir a lógica quando o assunto é religião? (...) Por que não ter uma religião baseada na indulgência? Certamente é muito mais condizente com a natureza da besta. Nós não somos mais fracos suplicantes, tremendo de medo diante de um “Deus” impiedoso que não se importa se vivemos ou morremos. Nós somos pessoas com respeito próprio e orgulhosas de nós mesmas – nós somos Satanistas!"
Considerações:
Esta capítulo é mais longo do que os dois anteriores dedicados a denúncia das religiões tradicionais como hipócritas e auto-destruidoras. Por sua vez este capítulo começa a oferecer o satanismo como uma alternativa real para satisfazer as necessidades humanas. Ele se inicia fazendo uma abordagem revolucionaria dos Pecados Capitais. “Capitais”, à título de informação, vem do latim caput, “cabeça”, ou seja, os pecados capitais seriam aqueles que supostamente encabeçariam todos os outros pecados conseqüentes. Estas sete graves faltas só foram listadas sob os auspícios do Papa Gregório Magno, no século VI.
LaVey sugere que os Pecados Capitais são na verdade os instintos humanos naturais e nada tem de pecaminosos. Que se traram de necessidades humanas inegáveis cuidadosamente identificadas pelo cristianismo para garantir que todo ser humano seja inevitavelmente um pecador e que portanto não tem escolha senão implorar o perdão de Deus, garantindo assim o poderio da Igreja sobre as pessoas por séculos a fio. Como se o Pecado Original já não bastasse para sujar condição humana, agora o simples fato de estar acordado já serviria para completar o trabalho. E ai dos preguiçosos que preferissem ficar na cama para evitar este problema!

Por sua vez LaVey declara que todos estes pecados capitais são o comportamento humano natural e que deveriam ao contrário ser considerados virtudes. Esta visão é muito semelhante a apresentada por Ayn Rand em Atlas Shrugged: “Qual é a natureza da culpa que seus professores chamam de Pecado Original? Qual é o mal que o homem adquire quando cai do estado que eles consideravam perfeito? Seus mitos declaram que ele mordeu o fruto do conhecimento - que ele adquiriu uma mente e se tornou racional. É adquiriu o conhecimento do bem e do mal, tornou-se um ser moral. E ele foi sentenciado a ganhar o próprio pão com seu trabalho e se tornar um ser produtivo. Ele foi ainda sentenciado a experimentar o desejo e adquiriu capacidade do desfrute sexual. Oras, o mal que ele adquiriu foi a razão, a moralidade, a criatividade e o prazer - valores cardeais da existência.”

O próximo alvo da B[íblia Satânica é até então intocável, Regra de Ouro: Faça aos outros o que gostaria que fizessem com você. LaVey demonstra que dar a outra face é uma estratégia fadada ao fracasso.  Segundo matéria publicada na  Revista Época nº 362, por Tânia Nogueira um estudo feito do professor Dominique de Quervain, da Universidade de Zurique, mostra que quando uma pessoa pune alguém há um aumento de fluxo-sanguíneo no estriado dorsal. Essa região, também conhecida como cérebro reptiliano, é uma das mais antigas na história da evolução de nossa espécie e nela se localiza uma série de sensações ligadas a satisfação de necessidades básicas, corrigir uma injustiça daria prazer, assim como matar a fome. (...) A vingança serve para coibir atos indesejados. Isso aumenta as chances de sobrevivência do grupo, explica Paulo Henrique Bertolucci, chefe do setor de Neurologia do Comportamento da Universidade Federal de São Paulo. Pagar com a mesma moeda pode parecer primário mas era a base da justiça dos homens. Veja-se a lei de talião, do código de hamurabi, da Babilonia, no século XVIII a.c, que pregava o olho por olho, dente por dente. Mesmo assim o estado ainda hoje não consegue legislar sobre a vida privada. Entre amigos e inimigos, a vingança pessoal ainda é a lei.  Contudo, o fato de uma região mais primitiva do cérebro ser acionada num primeiro momento não significa que a vingança é um ato inteiramente impensado. "O estriado dorsal está subordinado as estruturas mais evoluídas do cérebro", diz Bertolucci. "O córtex frontal é que decide entre o certo e o errado." por maior que seja a fome de vingança, seres racionais sabem que tem de pesar prós e contras de suas atitudes para não cometer atos dos quais podem se arrepender.

A lógica da reciprocidade é bem simples, e já foi inclusive comprovada em laboratórios. Programas computadorizados, que reproduzem o algoritmo evolucionário simulando formas de vida que tentam sobreviver e se reproduzir revelaram que os vencedores após milhares de gerações são sempre aqueles que, depois de uma primeira rodada apostando na cooperação, retribuí na próxima rodada generosidade com cooperação e exploração com vingança. Este script simples evita-se que o ente seja injustiçados duas vezes, se protegendo e se defendendo ao mesmo tempo que permite manter alianças com aqueles suficientemente colaborativos. Essa programação natural pode parecer ‘corrupta’ para uma mentalidade que estimula a aceitação passiva de agressões e injustiças e cruel para os organismos que depois de iniciar o conflito são por ela eliminados. Corrupto e cruel guarde estas palavras.

O fato é que a reciprocidade é extremamente bem sucedida em termos evolucionários, por mais que as religiões da luz branca tentem apagá-la. Mas além dela o ser humano graças ao seu desenvolvimento intelectual pode inclusive superar este script básico de sucesso. Enquanto serem racionais temos a chance única de analisar o contexto de cada interação com o ambiente e perceber quando uma vingança pode ser prejudicial e quando uma colaboração pode não ser benéfica, nos tornamos assim como diz LaVey, o animal mais “corrupto e cruel de todos”.

Nem sempre é benéfico para um soldado responder a altura um general, e nem sempre dar uma esmola a um mendigo será recompensador. Assim, mesmo a reciprocidade deve passar pelo crivo da razão, e mesmo a nossa ‘lei de ouro’ não vale mais do que uma moeda de prata se comparada à mente e juízo pessoal de um Satanista.
O capítulo continua, dessa vez mostrando como os próprios religiosos tiveram que reinterpretar seus livros sagrados frente a esse estranho novo espírtio que acordou nos anos 60. LaVey demonsra como gradualmente os sacerdotes se tornam mais indulgentes com os desejos humanos. E de fato, foi em 1959 que o Papa fez, pela primeira vez, o uso da palavra “aggiornamento”: adaptação. Isso refletia uma necessidade que ficaria cada vez mais evidente até o II Concilio do Vaticano em 1962-1965. O assunto oficial do concilio ficou bem claro na encíclica inaugural Ad Petri cathedran: “a renovação da vida cristã e a adaptação da disciplina eclesiástica às exigências da época presente”. Este período iniciaria na Igreja Católica o processo de adaptação ao mundo que já estava em andamento nas igreja protestantes desde longa data.

Os cultos neo-pentecostais ainda que sejam uma rentável máquina de alienação popular já representam uma evolução se comparada ao sofrível cristianismo medieval. A controversa Teologia da Prosperidade, já promete a felicidade, a prosperidade e a abundância para agora, não mais para o além. Os rituais possuem apelos cada vez mais emocionais e menos espiritualizados e a cura física é mais aclamada do que a absolvição dos pecados. A Igreja Universal do Reino de Deus é emblemática quanto a isso, pois já fornece tanto a “Terapia do Amor”, onde solitários podem dar vazão a seus anseios e encontrar parceiros, como a “Vigília dos Empresários”, onde homens de negócios se reúnem em busca da abundância material. Ou seja, guardadas as devidas proporções já temos um ritual de Luxúria e um de Compaixão, não temos ainda nenhum rito de Destruição, mas as “Seções de Descarrego” já transformaram o exorcismo num exercício de catarse espetacular, com direito ao medo e a curiosidade de ouvir o “demo” falar na televisão.

Monique Evans surpreendeu ao assumir sua identidade evangélica, e passando a freqüentar os cultos na Igreja Sara Nossa Terra, sem abrir mão do topless e da minissaia. “É possível aceitar Jesus sem ter que mudar nosso jeito de ser. (...) O topless é uma coisa natural em outros países e o importante é que nunca mais me senti sozinha e alguns milagres vêm acontecendo seguidamente em minha vida.” (Fonte: site da apresentadora). A sensualidade evangélica, é de fato, um fenômeno nacional e um destes termos contraditórios que marca o fim da cristandade tal como a conhecíamos neste inicio da Nova Era Satânica. Evangélicas famosas, como Baby do Brasil e Simony já posaram em capas de revistas masculinas, sem serem expulsas ou castigadas pelas Igrejas que freqüentam, na certeza de que “acredito muito em Jesus, e sei que ele nunca vai me julgar.” A cantora Greetchen exempifica muito bem o caso, considerando que fala maravilhas sobre o evangelho em programas de entrevistas, para logo depois estar novamente posando nua para revistas masculinas, incentivando suas filhas a fazerem o mesmo e lançando CD’s com o impagável título, “Piripiri de Jesus”.
Difícil ainda prever nos idos anos 60 o fenômeno do rock cristão que se desenvolveu nas décadas seguintes. Mas aquilo que LaVey conjeturou com escárnio, hoje muitos cristãos celebram com alegria. Nos idos dos anos 80 bandas como Agape, Love Song, Petra, Ressurection Band, e especialmente Stryper revolucionariam a musicalidade nas igrejas criando os primeiros estágios do rock cristão. Estas bandas encarregaram-se de rebelar-se contra preconceitos religiosos e culminaram na formação do White Metal como veículo novo e eficiente para a celebração cristã. Keith Green um dos principais músicos evangélicos internacionais, fundador do ministério “Last Days Ministries”, faz um mea culpa em nome da cristandade atual: "Para ser franco, tenho me sentido tão ofendido pela maioria daquilo que tenho visto e ouvido quanto uma doce vovozinha crente que, acidentalmente, acaba entrando num show de rock evangélico... não é o som que me desagrada, nem mesmo o volume, Deus sabe que não é a letra - é o espírito com que é feito. Trata-se da atitude do tipo "olha para mim!" que tenho presenciado em repetidos programas do gênero e também na síndrome do "será que vocês não percebem que somos tão bons quanto os roqueiros do mundo?", que tenho encontrado repetidamente nos discos evangélicos". Hoje, o espetáculo presente na musicalidade cristã é evidente. Showmissas e Marchas para Jesus unem fiéis e astros gospels para além do rock, todos os ritmos, do funk à lambada, são aceitos pelas congregações cada vez mais liberais, engrandecendo o ego e as contas bancárias daqueles que são justamente conhecidos pelas duas palavras: artistas evangélicos. Palavras estas em evidente ordem de importância.

Por fim, há tempos as Igrejas deixaram de ser os pontos centrais das cidades mesmo que ainda estejam presentes transformadas em pontos turisicos ou sucateadas. Hoje, shoppings, parques e centros de lazer são os destaques que levantam verdadeiros monumentos a indulgência humana. Observando assim o mundo a sua volta LaVey  chega a conclusão de que as antigas crenças  se adaptaram tanto, mudaram tanto que se tornaram obsoletas e que deveriam ser descartadas inteiramente e substituidas por uma religião verdadeiramente compromissada com as necessidades da carne. Satanismo é o nome desta religião;


Inferno, o diabo e como vender sua alma
Citação-chave: Satã tem sido indubitavelmente o melhor amigo que a igreja jamais teve, uma vez que foi ele que a manteve funcionando durante todos esses anos.  (...) O significado semântico de Satã é o “adversário”, o “opositor” ou o “acusador”. A palavra “demônio” se originou do latim daemon, que por sua vez veio da palavra gregadaimon que significa “deus”. Satã representa a oposição a todas as religiões que são contrárias ao ser humano e o condenam por seus instintos naturais. Ele apenas recebeu o papel de vilão porque representa os aspectos carnais, mundanos e materialistas da vida. (..) A maioria dos Satanistas não aceitam Satã como uma entidade antropomórfica com cascos fendidos, cauda pontuda e chifres. Ele simplesmente representa uma força da natureza – os assim chamados “poderes das trevas”,  que receberam este nome porque nenhuma religião foi capaz de tirá-los dessas trevas e nem a ciência foi capaz de aplicar um termo técnico para designá-los. Ele é um imenso reservatório intocado ao qual poucos tem acesso graças à habilidade que possuem de saber usar uma ferramenta sem antes ter que desmontá-la e então classificar cada uma das partes que a faz funcionar. (...) Satã como um deus, semi-deus, salvador pessoal ou seja lá como você prefere chamá-lo, foi inventado pelos criadores de cada uma das religiões da face da terra com um único propósito – para presidir sobre cada uma das atividades e ações tidas como pecaminosas realizadas pelos seres humanos aqui na terra. Consequentemente tudo que resultasse em gratificação física ou mental foi definido como pecaminoso – garantindo assim uma vida de culpa injustificada para todos! Então se foi de pecadores que nos chamaram, pecadores nós seremos – grande coisa! A Era Satânica está sobre nós! Porque não tirar vantagem disso e VIVER![20]
Considerações:

Neste capítulo LaVey se dedica a explicar uma pergunta essencial para quem já conhece e concorda com os pontos dos capítulos anteriores. A saber, "Se o ele não acredita nos conceitos tradicionais de deus e do diabo, por que chama a si mesmo de Satanista?"

Inicialmente é preciso purgar a mente de toda falsa concepção do que realmente é o diabo.H.P Blavatsky em A Doutrina Secreta escreveu que a Teologia, repetindo a famosa decisão de Trento, procura convencer as massas que: “Desde a queda do homem até o seu batismo, o Demônio exerce pleno poder sobre ele, e o possui de  direito.

A isso responde a Filosofia Oculta: “Primeiro provai a existência do Diabo como entidade, e então poderemos crer em semelhante possessão congênita.” Uma dose mínima de observação e de conhecimento da natureza humana será o suficiente para demonstrar a falsidade desse dogma teológico. Se Satã tivesse alguma realidade no mundo objetivo ou mesmo no mundo subjetivo (no sentido eclesiástico), seria o pobre Diabo quem sofreria uma obsessão crônica por parte dos maus – isso é, pela grande massa da humanidade. Foi a humanidade - e especialmente o clero, conduzido pela arrogante, pouco escrupulosae intolerante Igreja de Roma - que concebeu o Maligno, lhe deu nascimento e o criou com amor."

Um parênteses em relação ao Inferno tão apregoado pelas religiões do caminho da mão direita. Como mostra LaVey o inferno é uma idéia que se desenvolveu com o tempo. E na verdade o Antigo Testamento  possui uma descrição bem superficial para não dizer indiferente de como seria a vida após a morte. Sheol não era o castigo de fogo eterno dos cristãos, mas o buraco onde seriam colocados todos aqueles que não tem um lugar para serem sepultados. Na antiguidade não havia um estado preocupado em enterrar seus mortos, conseguir um túmulo não era para qualquer um. Assim, todo agrupamento de pessoas cavava um Sheol, um vale para serem jogados ou depositados os corpos dos indigentes, forasteiros e malfeitores.

Gradativamente Sheol deixou de ser uma cova onde os corpos de uma cidade habitam e passou a ser à sepultura comum da humanidade morta. Lemos na Enciclopédia da Vida após a morte , de James R. Lewis que os antigos hebreus enfatizavam a importância da vida presente em detrimento da pós-vida. Assim como os antigos gregos  e mesopotâmicos, a pós-vida, se é que lhe foi dada qualquer consideração  era concebida como uma pálida sombra da vida terrena, bem parecida como Hades grego. Também similar ao Hades grego, na pós vida hebraica não há distinção entre o tratamento dado aos justos e aos iníquos após a morte. Pelo contrário, recompensas e punições era ajustadas na vida presente, talvez por isso o sofredor Jó tenha orado para ser levado ao Sheol (Jó 14:13).

Uma das poucas histórias que mencionam o pós-vida é a da chamada Bruxa de Endor. O rei Saul tinha banido, sob ameaça de morte, todos aqueles que contatavam fantasmas e espíritos. Entretanto diante de um exército superior e sem receber respostas de Jeová, Saul disfarçado consulta  uma necromante. Essa mulher , que morava em Endor, convocou o espírito do profeta Samuel do Sheol. Quando Samuel chegou disse a Saul que este estava a beira da derrota e além do mais que “amanhã tu e teus filhos estarão comigo” (I Samuel 28:19). Ao afirmar que a Alma de Saul logo estaria residindo no lugar no mesmo lugar de repouso, aclara implicação é que as distinções morais não influenciam a sina pós-vida – os bons e justos (Samuel)  e os moralmente maus (Saul) terminam ambos no mesmo lugar, presumivelmente sob as mesmas condições.

As escrituras hebraicas usam a palavra Sheol de diversas significando "a sepultura", "o mundo dos mortos", “lugar de silêncio”, etc. e assim por diante. Para não ter de dar maiores explicações a cristandade eliminou as diferenças semânticas e todas as vezes que a palavra Sheol aparece na Bíblia, ela é simplesmente traduzida como “Inferno”.

A imagem do Inferno e do Diabo foram e ainda são usadas como ferramentas políticas. Hitler como um profundo conhecedor da psicologia das massas reconheceu e usou ele mesmo este ardil como podemos ler no capítulo 3 de seu “Mein Kampf”:

“Os chefes (do movimento pan-germânico) deviam saber que para conseguir êxito não se deve nunca mostrar para as massas dois ou mais adversários por considerações puramente psíquicas, pois isso só conduziria de outra maneira ao desagregamento da força combativa. Quem não consegue isso, não deve ter a pretensão de ser um chefe político. A arte de todos os grandes condutores de povos, em todas as épocas, consiste, em primeira linha, em não dispersar a atenção de um povo, e sim em concentrá-la contra um único adversário. Quanto mais concentrada for a vontade combativa de um povo, tanto melhor será a atração magnética de seus movimento e mais formidável o ímpeto de seus golpes.”
LaVey explica a origem da palavra "Satan" como um termo para designar "adversário" e não especificamente destinado a uma criatura sobrenatural ou a qualquer inimigo especificamente. Na versão original LaVey escreve que a palavra inglesa “devil” (diabo), se teria sua origem na palavra indiana devi, que significa “deus”, no entanto o dicionário Collins Concise dictionary Plus – Glasgow, 1989,  afirma que a origem semântica da palavra “devil” é, assim como “diabo” em português, a palavra latina diabolus, que se derivou da palavra grega diabolos, que significa “inimigo, acusador, caluniador”, contudo, existe também a possibilidade da origem estar no verbo grego diaballo, cujo significado é jogar no meio, atravessar o caminho ou metaforicamente, separar, dividir, fazer tropeçar e cair. A palavra “devi” a qual LaVey se refere é uma deusa Hindu, a personificação da energia feminina de Shiva. A palavra “devi” tem origem na palavra sânscrita Deva, que significa “brilhante” e é usada para descrever cada um dos deuses da teogonia bramânica.

A mesma publicação aponta que a origem da palavra inglêsa “demon” assim como o seu equivalente em português “demônio”  é a palavra grega daimon, que significa “espírito”, “deidade”, “destino”.

Entre os hebreus Satã era originalmente o adversário dos homens pois era aquele que tentava e testava sua fé. Contudo não era a princípio inimigo de Deus e sim um de seus filhos, um dos bene haelohim, nome este que mais tarde foi posto no singular pelos tradutores bíblicos para ocultar o fato de que os primeiros judeus eram politeístas.
Ele segue então com uma descrição mitológica e literaria sobre o significado de Satan, a começar pelo deus grego pã. O leitor deve entender que durante o processo de catequisação dos povos pagãos, uma das estratégias da Igreja Cristã era identificar as Trindades nos deuses locais ou relaciona-los a alguns de seus numerosos anjos e santos. Contudo vez por outra o clero se deparava com alguns personagens que simplesmente não podiam se encaixar na visão Cristã do mundo, senão como inimigo. Estes foram aos poucos enriquecendo o imaginário popular sobre como o Diabo deveria ser, e neste sentido, nenhum antigo deus contribuiu tanto como o venerável Pã.

Pã nasceu com chifres, rabo, cascos de bode e com o corpo parcialmente coberto de pelos. Com sua barbicha e rodeado de seus filhos igualmente animalescos, Pã parecia-se exatamente com a atual figura popularizada do Diabo. Representando a natureza e o desejo sexual, foi imediatamente identificado pelos olhos cristãos como um digno representante do mal.

A seguir trata-se da figura do bode expiatório usado para aliviar os homens de seus pecados no dia de Reconciliação, em hebraico Iom Hakkippurim, também chamado de Dies Expiationum e ainda Dies Propitiationis. Os rituais seguidos no Dia de Reconciliação estão explicados integralmente no capítulo 16 do Levítico. Era um dia solene de jejum, quando nenhum tipo de alimento podia ser ingerido e trabalhos servis eram proibidos. Era celebrado no décimo nono dia do Tischri, que caia em Setembro/Outubro. Nesse dia eram sacrificados um bezerro, um carneiro e sete ovelhas, mas a cerimônia mais distinta do dia era a oferenda dos dois bodes.  Quanto a isso no artigo “O Bode é ou não é a figura do diabo? publicado no periódico "O Berro - no. 49 - Maio/Junho 2002" é de espetacular interesse:

“Por que o bode é apontado como o diabo? Bom, isso faz parte da mitologia humana, vem lá dos tempos em que as tribos nômades habitavam a Eurásia. A História diz que deve ter sido por volta de 6.000 anos atrás, mas pode ser muito mais. Naquele tempo, os primitivos seres humanos juntavam gado selvagem e o criavam, geralmente dentro de buracos imensos no chão, ou em cercados naturais.

“Já nesse tempo, esses pastores-caçadores-criadores cultuavam um deus-touro, porque era símbolo da força, da masculinidade e do poder. O primeiro nome registrado na história para uma Deus-Touro é do Deus Mithra. Por que um touro? Essas comunidades, por se alimentarem regularmente de carne, destacaram-se entre as tribos vizinhas. A necessidade de pastos novos os transformavam em guerreiros e fazia deles expansionistas por natureza e, no início da era cristã, eles já tinham se espalhado da Índia até Portugal. O consumo de carne os fazia diferentes dos demais e, então, acreditavam que essa força ou energia vinha do touro.

“Assim, o culto a Mithra tornou-se muito popular no Império Romano. Em outros reinos, também haviam deuses com cabeça de touro.

“A Igreja Cristã, logo no início, tinha que derrubar o culto ao Deus Mithra mas não era fácil. Então transformou o dia de Mithra - 25 de dezembro - em dia do nascimento de Cristo. Pronto! Haveria uma festa geral: no início, metade festejava Mithra e outra metade festejava Cristo mas, com o tempo, o cristianismo foi ganhando impulso e o culto a Mithra apagou-se na História. Venceu o Dia de Natal, ou o Cristianismo.

“Mas a Igreja Cristã precisava de muito mais, precisava dar um corpo e uma fisionomia para o Diabo, pois ela dizia que havia um Deus do Bem e um do Mal. Ora, o Deus do Bem estava lá no céu e o deus do Mal estava aqui, no planeta terra, capturando almas para levar para o Inferno. No Céu estava um santo velhinho bondoso e na terra, ou no inferno, deveria estar um monstrengo feioso, de dar horror às criancinhas. Os ensinamentos persistentes sobre o Diabo foram tão intensos que os bispos cristãos resolveram estabelecer, durante o Concílio de Toledo, no ano de 447, a primeira descrição oficial do Diabo. Ele era a própria encarnação do mal: um ser imenso e escuro, com chifres na cabeça. Por que os chifres? Na verdade, os bispos quiseram sepultar, de uma vez, o deus Mithra, desenhando o Diabo com chifres de touro. Tentaram matar o antigo Deus transformando-o em Diabo.

“Os bispos, no entanto, erraram o tiro e quem pagou o pato foi o bode. O Diabo, devido à sua leveza, ardilosidade, esperteza, ladinice, etc. acabou sendo cada vez mais associado ao Bode e não ao touro Mithra. Afinal, não era fácil descrever um feiticeiro montado num touro diabólico mas era muito fácil descrever uma feiticeira voando pelos céus montada em bode infernal. Também não era fácil descrever um touro promovendo orgia em um dia de Sabá, mas era fácil para um bode. Para a Igreja isso não importava, pois ela queria um Diabo em oposição ao Bem, e também o sepultamento do antigo Deus milenar Mithra. Ademais, estava começando o período dos encantamentos e das bruxarias denominado como Idade Negra, em que a Igreja iria perseguir todos que fizessem qualquer pacto com o Diabo personificado sempre em um bode. Assim, a Igreja cristã foi conplacente e deixou que o bode assumisse o lugar do touro, ou seja, do deus Mithra. O inocente bode continua pagando o pato até hoje.

“Foi assim que, mesmo sem querer, o Bode transformou-se na figura do mal, no pr-prio Diabo, conforme consta em milhares de ilustrações e iluminuras da Idade Média. Pobre bode que sempre se interessou apenas por um punhado de folhas secas para garantir sua refeição.”

Azazel aparece no Dicionário Judaico de Lendas e Tradições de Alan Uterman como o destino do bode expiatório que carregava os pecados de Israel para o deserto no Iom Kipur.

"Deitando sortes sobre os dois bodes, para ver qual deles será imolado ao Senhor , e qual será o bode emissário." E, para expiar o santuário das impurezas dos filhos de Israel, das suas prevaricações contra a lei, e de todos os seus pecados "(Lev. 6,8-34).

Dois bodes idênticos eram selecionados para o ritual. Um era escolhido, por sorteio, como oferenda a Deus, e o outro era enviado para Azazel, no deserto, para ser lançado de um penhasco. O sumo sacerdote recitava para o povo uma confissão de pecados sobre a cabeça do bode expiatório, e uma linha escarlate era enrolada, parte em volta de seus chifres, parte em volta de uma rocha no topo do penhasco. Quando o bode caía, a linha tornava-se branca, indicando que os pecados do povo haviam sido perdoados. Embora a palavra Azazel possa se referia a um lugar, ou ao bode, também foi explicada como sendo o nome de um demônio. Os pecados de Israel estariam, pois, sendo devolvidos à sua fonte de impureza. Os cabalistas viam no bode um suborno às forças do mal, para que Satã não acusasse Israel e, ao contrário, falasse em sua defesa. Azazel é também o nome de um anjo caído.

O nome de Azazel (como poder sobrenatural) significa "deus-bode". Na demonologia mulçumana, Azazel é a contraparte do demônio que refusou a adorar Adão ou reconhecer a supremacia de Deus. Seu nome foi mudado para Iblis (Eblis), que significa "desespero". Em Paraíso Perdido (I, 534), Milton usa o nome para o porta bandeiras dos anjos rebeldes.

LaVey segue com uma breve explicação da figura do diabo em diversos povos. segundo o Dicionário de Símbolos - Jean Chevalier & Alain Gheerbrant, editora José Olympio & Satã o Príncipe das Trevas – Joan O’Grady, editora Mercuryo  Baal, significava “Senhor”, era uma das maneiras à qual os semitas se dirigiam a uma das divindades locais. Baal era o consorte de Belit, ambos deuses adorados pelos semitas, Baal como deus do furacão e da fecundidade e Belit como deusa da fecundidade, sobretudo agrária. Os profetas judeus que anunciavam em Jeová um Deus de concepção mais elevada, opuseram-se a esses cultos antigos que renasciam incessantemente e que celebravam, ao ponto da exacerbação e do monstruoso, a sacralidade da vida orgânica, as forças elementares do sangue, da sexualidade e da fecundidade. O culto de Baal chegou mesmo a simbolizar a presença ou o retorno periódico, em toda civilização, de uma tendência a exaltar as forças instintivas. O culto jeovista salientava a sacralidade de uma maneira mais integral, santificava a vida sem desencadear as forças elementares..., revelava uma regra espiritual em que a vida do homem e seu destino se outorgavam novos valores; facilitava uma experiência religiosa mais rica, uma comunhão divina mais pura e mais completa.

Já Belzebu seria uma derivação de Baal, Senhor, e Zebub, moscas. O nome de Baal Zebub é mencionado apenas no Velho Testamento, em 2Reis 1, o rei de Israel manda mensageiros para perguntar a Baal Zebub, o deus de Acaron, se ele se recuperaria de sua enfermidade. O anjo do Senhor diz a Elias que vá ao encontro dos mensageiros do rei e lhes diga: “Porventura não há um Deus em Israel, para irdes consultar Baal Zebub, rei de Acaron? Por isso... com certeza morrereis”. Portanto Baal Zebub poderia representar o Baal para quem as moscas são sagradas – o Senhor das Moscas. Hoje se sabe que a divinização por intermédio das moscas era praticada na Babilônia.

Ainda relativo aos nomes do diabo há de se complementar que o povo brasileiro é certamente um dos povos que mais tem nomes para o Diabo, mas por um motivo bem distinto da variedade de nomes vindos da Europa. Enquanto no velho continente os antigos deuses viraram nomes para o demônio, aqui o Diabo ganhou uma imensidão de novos apelidos. No nordeste colonial o demônio era respeitado e temido sendo o personagem central de diversas lendas e crendices. Uma destas crendices trazidas pelos portugueses  era que se alguém pronunciasse o nome de Satanás, ele poderia aparecer. Para que isso não acontecesse, os cristãos da nova terra inventaram uma imensidão de apelidos para o Diabo que assim não poderia se reconhecer quando invocado.

Estes apelidos surgiram do imaginário português, africano e indígena e resultaram em uma rica coleção de nomes que Satã ganhou desde então: Anjo Safado, Anjo Mau, Anhangá, Atentado, Afuleimado, Arrenegado, Amaldiçoado, Azucrim, Beiçudo, Bicho, Bicho-Preto, Bute, Barzabu, Bruxo, Bode-Preto,  Cafuçu, Cafute, Caneco, Canheta, Canhoto, Canhim, Cão, Cão-Miudo, Cão-Preto, Cão-Tinhoso, Capeta, Capete, Capiroto, Capirocho, Careca, Carocho, Capa Verde, Chifrudo, Compra-barulho, Cifé, Coisa, Coisa à Toa, Coisa Má, Coisa Ruim,  Contra, Coxo, Cujo, Diá, Demo, Diacho, Diangas, Dianho, Diogo, Diale, Dedo, Debo, Decho, Diabro, Diale, Dialho, Droga, Dubá, Ele, Esmolambado, Excomungado, Feio, Figura, Feiticeiro, Ferrabrás, Fute, Futrico, Futriqueiro, Galhardo, Gato-Preto, Gato-Tinhoso, Horrível, Homão, Indivíduo, Imundo, Inimigo, Jumento, Judiento, Jurupari,  Lazarento, Mafarrico, Maioral, Mequetrefe, Mal-Encarado, Maldito, Mofento, Maligno, Malino, Malvado, Mau, Moleque,  Não-Sei-Que-Diga, Negrão,  Nojento,  Orgulhoso, Pé de Cabra, Pé de Pato, Príncipe, Pé Cascudo, Pé de Gancho, Pé de Peia, Peitica, Pedro Botelho, Porco, Porco-Sujo, Que Diga, Rabão, Rabudo, Rapaz, Romãozinho, Sapucaio, Surrão, Sujo, Sapucaio, Sarnento, Sete Peles, Surrão,  Temba, Tentação, Tendeiro, Tição, Tisnado, Tinhoso, Urubu, Urué, Vadio, Viciado, Visagem, Zinho, etc... Que outro lugar deu tantos títulos ao príncipe das trevas?
Avançando na história do arquétipo do Mal, vale dizer que com relação a Divida Comédia que Dante Alighiere tinha um fascínio e conhecimento considerável sobre as tradições islâmicas e delas extraiu muito de sua obra com especial destaque para o episódio de al-isrá ual miraj, a ascenção a descrição dos céus e do inferno feita pelas sagradas tradições segundo as quais o Profeta Mohammad foi levado corporeamente para conhecer e relatar as maravilhas dos céus e os castigos do inferno. Ocidente deve muito de sua visão metafísica as narrativas islâmicas. Se a cristandade introduziu a idéia de um Inferno o islamismo levou esta idéia até suas últimas conseqüências. Mulheres suspensas em correntes pelos seios,  homens obrigados a continuamente engolir bolas de fogo que saiam pelo anus, pessoas imobilizadas por suas barrigas do tamanho de casas e que sem poder fugir eram eternamente pisoteadas pelas multidões que fugiam do fogo, etc.. Suas descrições são extensas, detalhadas e especialmente amedrontadoras, e se provaram bastante eficientes em manter o status quo islamico.
Chegamos então a lenda de Fausto. Uma tentativa de se satanizar o próprio progresso. A palavra ciência, que significa literalmente conhecimento só começou a ser usada popularmente como nós a conhecemos após o século XIX. Na época não havia distinção entre magia e a filosofia natural. Na Inglaterra do séc. XVI pessoas chegavam a ser presas acusadas do crime de "calcular". Nesta época a matemática era considerada uma forma de possessão de poderes mágicos, as autoridades "queimavam livros de matemática como se fossem livros de evocação".

A personagem conhecida como Dr. Faustus apareceu pela primeira vez em 1587 num impresso que reuniu diversos contos da tradição oral conhecidos na Alemanha. Como LaVey escreveu, a história central é a de um brilhante estudioso que fez um pacto com o Diabo em uma floresta próxima de Wittenberg. No pacto, o Diabo serviria Dr. Faustus realizando todos os seus desejos até a morte e dando-lhe conhecimento preciso sobre qualquer coisa, sem nunca mentir. Do outro lado Dr. Faustus renunciaria sua fé cristã e abdicaria de seu corpo e alma 24 anos depois. Todos os seus desejos foram concedidos e ele usufruiu de luxo, fartura e lindas mulheres, incluindo Helena de Tróia, que fez reaparecer dos mortos. O Diabo o ajudou a viajar desde as profundidades da terra até as mais distantes estrelas sempre acompanhado de vasto conhecimento e precisas profecias. A figura ganhou vida no imaginário alemão  e entre outras lendas conta-se que fez aparecer um pomar florido em pleno inverno e que teria ido até Roma, invisível, importunar o Papa. Voava em barris de vinho pelos céus e criava ilusões como parreiras que surgiam do nada e que surpreendiam os incautos que tentassem colher uvas quando percebiam que estavam apertando os narizes uns dos outros. Estas estórias fantásticas que hoje poderiam ser contadas à crianças para seu divertimento foram levadas muito a sério por Martinho Lutero e demais líderes da reforma protestante, sendo uma das narrativas prediletas do povo alemão incluindo autores de peso como Goethe, Klaus Mann e Thomas Mann.

Finalmente neste capítulo LaVey afirma que Satan e todos os demônios são representações perfeitas da natureza carnal do homem e oposição a toda conformidade servil a deuses externos. Satan como arquétipo é o símbolo ideal para uma religião que exalta a independência filosofíca e a natureza carnal, históricamente tida como pecaminosa.  Como conclui Vilém Flusser em "A história do diabo": “A evolução do diabo e a evolução da vida são pelo menos paralelas. O réptil é perfeitamente identificável no diabo sofisticado da nossa época elegante. Uma das teses deste livro será, com efeito, a afirmativa de que a evolução da vida não passa de encarnação da evolução do diabo. O leitor que refreie a sua indignação justa. Terá oportunidade, no curso do livro, de dar vazão livre a ela. O que pretendo neste instante é apenas semear o germe da dúvida seguinte: quem está mais possesso pelo diabo, o protoplasma quase inerte das épocas imemoriais, com sua paciência humilde, ou a formiga devoradora e a humanidade especulante?”


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Mundos Ocultos Por Allenozth